Cecília Meireles, Manuel Bandeira e Mário Quintana: reencontros
Já tem mais de um mês que dei com algumas novidades muito
boas que as editoras estão trazendo para a literatura nacional. A surpresa de
entrar numa livraria e encontrar livros que, já tem algum tempo que só resistia
nas estantes dos sebos e alguns nem mesmo aí encontrávamos se confunde com a preocupação
que tenho enquanto professor de literatura que assiste ao desencantamento ou
distanciamento do público para com a leitura de obras de qualidade.
Há,
evidente, muitos fatores negativos que estão entre o leitor e o livro, mas acho
que o mais grave deles é quando falta o segundo elemento, afinal, não há leitor
se não há livro. E tem algum tempo que a ideia de lucro tem falado mais alto e as editoras têm se preocupado e tanto com a fabricação de Best-Sellers, relegando o trabalho árduo da boa literatura às editoras de fundo de quintal, sem expressividade quantitativa frente à ordem tresloucada do capital.
Da surpresa que tive nas livrarias, esta se refere ao trabalho de reedição de Mario
Quintana, Manuel Bandeira e Cecília Meireles. É fato que antes desses autores já
Carlos Drummond de Andrade mal saído das prateleiras também já vinha sendo reeditado
e Jorge Amado que continua ampliando seu universo de leitores graças, e aqui está a vantagem de um grande conglomerado editorial se interessar por uma obra literária,
a série de empreitadas postas ao longo desse ano de 2012, ano do seu primeiro
centenário. Também João Cabral de Melo Neto e agora Graciliano Ramos deverá está mais presente nas estantes das
livrarias, seja porque se inicia um ano de comemorações em torno dos seus 120
anos, feitos no último dia 27 de outubro.
Cecília Meireles e Manuel Bandeira saem pela Global. Da autora, é destaque Romanceiro da
inconfidência, publicado pela primeira vez em 1953 e já algum tempo fora
dos catálogos. Este é um dos pontos
altos da obra de Cecília que recria poeticamente os dias de angústia e esperança
do final da década de 1780, em que um grupo de intelectuais de Minas Gerais
sonhou com a libertação do Brasil do domínio colonial português. Conforme resenha
publicada no site da editora, Cecília se utiliza da técnica de escrita dos
romanceiros populares, buscando nos autos dos processos, nas correspondências,
nos testamentos, na pintura, na literatura oral e nas esculturas de Aleijadinho
motes para recriar a atmosfera do tempo retratado, recuperando no seu
itinerário figuras como as de Tomás Antonio Gonzaga, o eterno amante de
Marília, Cláudio Manuel da Costa, Bárbara Eliodora, Tiradentes, aí retratado
como um Cristo revolucionário, imagem que se constrói a partir do século XIX.
Destaque nas reedições de Cecília Meireles são ainda Viagem, um livro intimista publicado
ainda em 1939 e Ou isto ou aquilo, publicação
que ganhou destaque no cenário da literatura infantil brasileira. A obra vem
ilustrada por Odilon Moraes, que no alto da honradez pelo trabalho de ilustrar
um clássico confessa que a obra, uma das prediletas da sua mulher, é também um livro que prima pelo
maior dos desafios no tempo da infância: a questão da escolha, que é decerto também um modo particular da
própria escritora de ver a vida.
Já de Manuel Bandeira, os destaques são Estrela da manhã, Estrela da
tarde e a autobiografia em prosa Itinerário
de Pasárgada. O primeiro, por exemplo, é já um clássico e é a obra que terá
servido de impulso poético para muitos outros poetas da geração de Bandeira e
posteriores a ele. Publicado em 1936, com tiragem mínima de apenas cinquenta
exemplares que o autor fez questão de assiná-los um a um e Portinari lhe compôs
o desenho de capa, é marco na cena literária brasileira porque aí se firma o
poeta de Libertinagem, livro que alcança
o limite de ruptura com a tradição.
Agora, Mario Quintana sempre esteve na moda entre as
editoras. A L&PM e a Nova Aguilar já haviam publicado antologias
consagradas e agora é a Alfaguara a que assume o papel de reeditar seus
trabalhos, individualmente e já é possível de encontrar nas livrarias A vaca e o hipogrifo, Poemas para ler na escola, O aprendiz de feiticeiro seguido de Espelho
Mágico A rua dos cataventos, Canções,
Sapato florido, Apontamentos de história sobrenatural e A cor do invisível.
Motivos, vê-se, não faltam para ler produção de qualidade, brasileira, e necessária de se ter conhecimento, seja quem se mete a escrever, seja quem apenas quer (e deve querer) enriquecer sua bagagem cultural nesses tempos sombrios em que cultura se confunde com massificação.
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