Paris-Manhattan, de Sophie Lellouche
Por Pedro Fernandes
Até onde vai a admiração pessoal de alguém pelo trabalho de
um artista? Será que somos, no itinerário da admiração, tão influenciados pelo
trabalho do artista a ponto de vivê-lo como uma de nossas manias e obsessões? Duas perguntas
caras para responder assim tão facilmente, no entanto, uma coisa certa: não há como
explicar determinadas paixões e talvez não haja mesmo limite para admiração, tampouco
possamos nos ‘livrar’ das influências.
Em Paris-Manhattan,
que é o primeiro longa metragem da francesa Sophie Lellouche, Alice é uma jovem
parisiense que tem mais que admiração pelo cineasta Woody Allen. Os seus filmes
não apenas são vividos pela personagem, como ela admite numa voz alter-ego da
própria diretora, que eles são extremamente ricos pela capacidade de abordar as coisas mais comuns da vida humana no tom certo. E o diálogo costurado com a
produção do cineasta é tanto que, não se restringe à conversa que a personagem
mantém com um pôster e que vai costurando todo o filme com máximas de Allen. O próprio
filme da Sophie tem um jeito muito Woody Allen de ser.
Alice é uma farmacêutica que herda a profissão de família e
vive em função do trabalho, além dos filmes do Woody Allen que receita entre
uma venda e outra de remédios. Pressionada pela família a casar-se, parece que
todos os homens que se aproximam dela não lhe serve; talvez ‘praga’ porque o
último pelo qual se apaixonou foi tomado sem nenhuma explicação pela irmã. O envolvimento
com um homem casado que partilha dos mesmos gostos que ela pode ser a solução. Ou
não. O envolvimento desinteressado com Victor, uma espécie de faz tudo
contratado para cuidar do serviço de segurança na farmácia onde ela trabalha, e
que não tem nada a ver com ela, nem mesmo nunca viu um filme sequer do Woody
Allen. Sim, este talvez seja o cara ideal.
Victor a levará uma independência da permanente ligação com o
trabalho do artista. Tudo bem que o trabalho lhe mude em alguma coisa – como o
ladrão que vai assaltar a farmácia e depois do feito foge ileso com ajuda da
própria Alice que lhe receita três DVDs e ele, volta no correr do filme, ao que
parece, regenerado. Mas, vivê-lo é outra coisa, porque cada vida é somente isto:
uma vida. E por mais semelhanças que possa haver entre uma e outra, é única,
imitável. Ou se tem noção disso ou corre o risco de se transformar num pastiche.
Paris-Manhattan é a história de uma admiração,
mas é também a história de uma necessária libertação dos limites de uma admiração.
E tudo, adivinhem, intermediado por dois processos de face dupla (que tanto
pode prender como libertar): um, a própria admiração; outro, o amor.
Destaque é para a participação do próprio Woody Allen. O cineasta
foi recebido pela produção do filme e aceitou fazer uma ponta no longa.
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