103 anos de uma tragédia


Em 1905, Euclides da Cunha partiu em viagem para a Amazônia como chefe da Comissão Brasileira de Reconhecimento do Alto Purus, uma experiência que resultou numa parte importante da sua obra, ao lado daquela que resultou em Os sertões, seu livros mais importante. Ele permaneceria no norte do país pelo menos um ano, enfrentando todas as circunstâncias perigosas numa região totalmente inóspita.


Anna Emílio. Foto publicada na Wikipédia.

No Rio de Janeiro, sua mulher Anna Emílio Ribeiro, com quem se casou em 1890, mantém um enlace amoroso com um jovem militar, dezessete anos mais jovem. Filha de major e de um dos principais propagandistas da República no Brasil, ela conheceu Euclides da Cunha numa das visitas realizadas pelo escritor à casa Ribeiro. Nascido em Cantagalo, não esqueçamos, que ele estudou na Escola Politécnica Militar da Praia Vermelha; a vida de militar o manteve em trânsito entre os seus pares.

Euclides da Cunha teve Anna Emílio cinco filhos. As traições, sonda-se, já aconteciam desde o nascimento do último deles: o menino era alourado, filho de duas pessoas morenas. O escritor regressa da sua empreitada no Norte muito debilitado pelos efeitos da malária em 1906. 


Dilermando de Assis. Foto publicada na revista O malho.

Dilermando de Assis contava 17 anos e morava na Escola Militar quando conheceu Anna Emílio. E os dois passam a manter o caso amoroso que se alimenta nas longas ausências de Euclides da Cunha.

Sabendo-se da vida familiar destruída depois de uma longa discussão travada na noite de 14 de agosto de 1909, a mulher abandona a casa onde morava com Euclides da Cunha, em Copacabana. Desamparada, hospeda-se com os filhos na casa do amante, no bairro da Piedade. 

Na manhã seguinte, depois de descobrir que Anna não dormira em casa, Euclides sabedor do refúgio da mulher na casa de Dilermando Assis, bate em retirada ao local do crime. Determinado a matar ou morrer, o escritor foi recepcionado pelo irmão, Dinorah. 


A troca de tiros entre Euclides da Cunha e Dilermando de Assis. Desenho publicado na revista O malho.

As circunstâncias apontam que Euclides da Cunha sacou sua arma e disparou contra Dilermando. Vendo o irmão atingido, Dinorah procurou tirar a arma das mãos de Euclides e acabou sendo baleado. Com os dois alvejados, o escritor deixa casa, mas é, antes de passar pelo portão de ferro da frente da residência, atingido por Dilermando.


Foto 1: Esquema das lesões na face posterior do corpo de Euclides da Cunha. Foto 2: Esquema das lesões na face anterior do corpo de Euclides da Cunha. Os esquemas foram compostos pelo Serviço Médico Legal.  Reproduções publicadas no site em homenagem ao escritor.

Após a morte de Euclides, Ana e Dilermando se casaram, Dinorah ficou paralítico como consequência do dano causado pela bala. Jogador e impossibilitado de continuar a carreira, anos depois se suicidou.

Em 1916, numa ocasião quando Dilermando se dirigia ao Cartório no Rio para adotar o filho mais novo de Euclides, foi atacado pelo filho mais velho. Outro crime se impôs: Dilermando sacou da arma e o matou.

Depois de casado com Anna, Dilermando teve com ela cinco filhos. Os dois foram casados até 1926, quando descobriu que, durante todo esse tempo, ele sempre teve uma amante, Marieta, com quem se casou depois da separação. 

Sozinha, Anna mudou-se para Paquetá e morreu de câncer, em 1951. 

O crime e seus desdobramentos entraram para o rol das mais notáveis histórias de violência passional e serviram de inspiração para Glória Perez redigir o seriado Desejo, exibido pela TV Globo em 1990.


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