Branca de Neve e o caçador, de Rupert Sanders
Por Pedro Fernandes
Charlize Theron em cena como a rainha má. Seu papel convence e é responsável pelos melhores momentos de Branca de neve e o caçador. |
É lógico que nunca haveria de passar pela cabeça dos irmãos Grimm, os que primeiro registraram o conto da tradição oral europeia do século XIX, que a história pudesse se manter tão atual e capaz ainda de duas ressignificações como as que recebeu neste ano. A de agora, infinitamente superior à anterior, que trouxe a rainha má sob a bela interpretação de Julia Roberts e que comentei aqui. Também é a versão superior às que foram feitas por exemplo pelo Walt Disney, que, méritos à parte, saiu adocicando tudo quanto foi narrativa vista pelos olhos inocentes da cultura pop. E que não nos esqueçamos que as narrativas coletadas pelos Grimm nunca tiveram esse tom desenhado depois.
O filme de Rupert Sanders parece não ter esquecido disso e conseguiu colocar na tela uma Branca de Neve com um tom muito próximo da violência psicológica do conto tradicional e conseguiu, sem fazer grandes violações ressignificá-lo para os tempos atuais; cito como mérito dessa atualização o espírito guerreiro a Joana D'arc incorporado por Branca.
Só em ter conseguido essas duas façanhas - recuperar a tradição e inovar - são atitudes já dignas de louvor num território em que os grandes estúdios de cinema têm investido para valer na comercialização e reduzido suas produções ao mal pastiche e ao mero joguete dos efeitos especiais. Evidentemente que há um diferencial: diz-se que Rupert conseguiu finalizar seu filme que pretendia ser um épico peregrinando de estúdio em estúdio até apresentar a Hollywood e este escolhê-lo como melhor produção dentre as muitas propostas de releitura do clássico. Por falar nos efeitos especiais, eles estão lá, mas muito bem distribuídos e não perdem para o enredo e nem para outras nuances importantes num filme, como as ações e a fotografia. Claro que há alguns exageros que deixam o filme num baixo tom, como a cena de luta de Branca e o caçador com uma espécie de monstro adormecido guardião da floresta negra.
Só em ter conseguido essas duas façanhas - recuperar a tradição e inovar - são atitudes já dignas de louvor num território em que os grandes estúdios de cinema têm investido para valer na comercialização e reduzido suas produções ao mal pastiche e ao mero joguete dos efeitos especiais. Evidentemente que há um diferencial: diz-se que Rupert conseguiu finalizar seu filme que pretendia ser um épico peregrinando de estúdio em estúdio até apresentar a Hollywood e este escolhê-lo como melhor produção dentre as muitas propostas de releitura do clássico. Por falar nos efeitos especiais, eles estão lá, mas muito bem distribuídos e não perdem para o enredo e nem para outras nuances importantes num filme, como as ações e a fotografia. Claro que há alguns exageros que deixam o filme num baixo tom, como a cena de luta de Branca e o caçador com uma espécie de monstro adormecido guardião da floresta negra.
Destaque mesmo é para Charlize Theron, incorporando o papel da Rainha Ravenna. A atriz consegue transmutar-se na personagem e recuperar, no limite certo, o seu ar de malignidade. Gostei da ideia de justificar, para o desenvolvimento da psicologia da persona, como ela adquiriu o comportamento de má, denotando que a maldade da rainha tem uma raiz até certo ponto compreensível e não apenas é fato imanente da natureza. Conseguimos acompanhar com integralidade o processo de modificação da personagem e entender objetivamente seus movimentos no interior da narrativa.
Se o mal é o lado mais interessante a ser explorado pelas histórias em geral, eu não sei, mas devo dizer que, em termos de interpretação este Branca de Neve novamente é salvo por esta faceta. Digo, isso porque o pastiche ensaiado no Branca de neve anterior é recuperável graças ao modo como Julia Roberts incorpora a personagem má.
Imerso que ando revendo papeis femininos em tudo quanto é texto, chama-me atenção a movimentação delas num filme em que apenas a figura do caçador e do conde roubam vez por outra o caráter atuante delas. Isso porque as duas potências maiores estão representadas por figuras femininas: uma na ânsia por recuperar o de direito, o trono, já que o pai-rei fora assassinado no leito de núpcias e a outra na ânsia de perpetuar a juventude e a beleza - desejo naturalmente humano - e dá início a um império cujo foco é a caça de mulheres jovens e belas das quais se alimenta para essa preservação. Destaque aqui para a tribo das mutiladas, cujas faces são marcadas para que se tornem esteticamente feias e com isso escapem do olhar astuto do espelho mágico da rainha e sua busca pela mais bela do reino.
A fuga dos desfechos comuns de que toda mulher deve se subordinar a homem para "ficar bem na foto do foram felizes para sempre" é escamoteado, ainda que durante todo o filme se tenha ensaiado um movimento de desejo entre o caçador, o conde e a futura rainha, no fim, o que prevalece é uma luta pelo poder que quererá ser contrário ao que governa.
Enfim, seria exagero afirmar aqui que este Branca de Neve e o caçador é
uma das melhores produções cinematográficas que assisti até agora em
2012, porque não foi e não é. Talvez seja uma das mais bem acabadas e
bem elaboradas, mas nada que leve o filme a categoria suprema.
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