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Mostrando postagens de abril, 2012

Ler a Odisseia (parte III)

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Por Pedro Fernandes Detalhe de um vaso grego.  Pelike  ática de figuras vermelhas do Pintor de Licáon. Data c.-440. Boston, Museum of Fine Arts. Fonte: Portal Graecia Antiqua. (Na imagem) Ulisses no Hades. Ao seu lado o deus Hermes e à sua frente a sombra de Elpenor, antigo companheiro que morre quando da sua passagem pela ilha de Circe. A súplica de Elpenor se insere na trajetória do herói como prenúncio do fim de uma viagem a que qualquer um pode está destinado: o do esquecimento. Aponta para a conservação da memória como necessidade à própria existência. * Comumente nos referimos ao ato de viajar como um processo de fuga do lugar-comum e de renovação do tempo - “Viajar é preciso senão a rotina te cansa”, dirá a música. A experiência da viagem traz implícita ainda o exílio, o desejo pelo desconhecido, pelo crescimento espiritual, em busca de novas vivências e experiências. Se pensarmos mais entenderemos que a nossa própria vida é uma viagem terrena que dura o tempo que vivemo

James Joyce online

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James Joyce, Ulisses . Manuscrito autografado, p.1 (detalhe). Paris (1920). Fonte: The Rosenbach Museum & Library Está para chegar em breve ao Brasil mais uma tradução para Ulisses , o principal romance de James Joyce. A primeira versão do portentoso romance veio a lume em 1966 pelas mãos do filólogo Antonio Houaiss. Depois, em 2005, foi a vez da professora de literatura da Universidade Federal do Rio de Janeiro, Bernardina da Silveira Pinheiro. A nova tradução vem pelas mãos do professor da Universidade Federal do Paraná, Caetano Galindo e sob revisão do tradutor Paulo Henriques Britto. Fora do Brasil, é significativa a confusão em torno da publicação de The cats of Copenhagen publicado no início desse ano pela ITHYS PRESS. Alegam que os da editora não detinham os direitos para a atitude tomada. O desfecho para isso? Não sabemos, mas temos acompanhado.   Confusões à parte e enquanto o novo Ulisses não chega por cá, no início deste mês a Biblioteca Nacional da Irlanda

Uns patriotas

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Por Pedro Fernandes Não, não é erro de grafia. Mas, o novo livro de Nelson Patriota, Uns potiguares  (Editora Sarau das Letras) bem assim poderia ser chamado. Porque este é um livro com escolhas aleatórias ou afetivas do escritor. E suas leituras aí apresentadas dispensam qualquer rigor acadêmico. Ficamos diante de um leitor comum que escolhe por no papel e, portanto, abrir ao público, seu modo de ler e como que os diversos temas evocados nesse instante são por ele compreendidos ou como ele os entende do ponto de vista do próprio escritor o enforme de determinadas obras.  A atitude, entretanto, de Nelson é mais que válida. Talvez o cientificismo pesado da crítica literária tenha feito com os leitores comuns - esses que passaram para o espaço da intelectualidade desde meados do Romantismo - se dispersem. Evidente que se seguiu, além disso, uma pesada investida dos próprios de determinado período a se fecharem nos seus universos de palavras e se fixarem num entendimento do

Alves Redol

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Alves Redol. Foto: Sam Payo Já falei por aqui não poucas vezes que há um pacto entre escritor e leitor que é construído invisivelmente no momento em que o primeiro está a escrever sua obra. A função exata desse pacto é o a de ser "desafio" ao segundo elemento dessa relação. De modo que, particularmente, a mim interessam-me as obras que me desafiam. Assim foi com Alves Redol quando me deparei pela primeira vez com seu famoso texto, Gaibeus . Pois bem, já em Fanga o autor português assim se expressava: "Não é difícil entender-se o que escrevo e porque escrevo. E também para quem escrevo. Daí o apontarem-me como um escritor comprometido. Nunca o neguei; é verdade. Mas também é verdade que todos os escritores o são." Para quem escreve um escritor? Essa talvez seja uma das perguntas que juntamente com por que escreve e o que escreve seja a mais buscada a resposta dos escritores. Curiosa pergunta que foi respondida a certa altura pela Inês Pedrosa num desses pr

"Asymptote" e Flávio Araújo

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A web é, cada vez mais, o lugar onde mais proliferam invenções literárias. Se antes da existência da internet os escritores ou aspirantes a se punham a engavetar papeis, agora, muitas dessas gavetas estão abertas por aí. Às vezes abertas só para um pequeno e afetuoso público, muitas outras para um público sem tamanho, o suficiente para despertar nos grandes conglomerados editoriais o interesse em transformar toda essa parafernália digital em papel.  Descubro recentemente mais uma dessas gavetas que como o Letras in.verso e re.verso anda a buscar pessoas talentosas para si, do modo como faz o caderno-revista 7faces . Asymptote . É este o nome do lugar . Ao modo do periódico nascido daqui, Asymptote se apresenta como uma revista internacional dedicada à tradução literária e a reunir em um só lugar o melhor da escrita contemporânea . "Estamos interessados ​​em encontros entre as línguas e as conseqüências desses encontros." Asymptote é o nome dado à linha po

Livro é objeto-sujeito

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Por Pedro Fernandes Pormenor de O bibliotecário . Giuseppe Arcimboldo. Óleo sobre tela, 1562. Acho que não é mais necessário falar sobre o legado insofismável dos livros. Sim, eles mesmos que não de hoje, mas hoje é dia, têm data comemorativa mundial. Data controversa porque, quando se criam dias para , eles servem para quê? Para não deixar que a coisa ou fato comemorado caia no esquecimento.  Essa deve ser a primeira resposta que vem a cabeça de todos que forem confrontados com a pergunta. E a resposta é verdadeira; tanto que o difícil é precisar explicar por outro caminho. Não me darei ao trabalho de fazer esse outro caminho possível. Tais datas existem para isso e pronto. Já têm, quando de sua criação, suas necessidades desenhadas e muito se comenta o porquê de ter escolhido a tal altura um dia específico em que se deseja que uma determinada coisa ou fato seja longamente lembrado para que possua também longa vida. Quero apenas dizer que, além de um legado com palavras o livro

Ler a Odisseia (Parte II)

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Por Pedro Fernandes "o amor ocidental deve muito aos mitos de sua formação como Tristão e Isolda ou Romeu e Julieta , mas antes deles não há como esquecer do amor entre Penélope e Ulisses" Já disse alguém, e não terá sido o primeiro, que Homero é um mistério, um enigma. Nada se sabe sobre sua vida e, o pouco que se sabe é um rol de possibilidades. Entretanto, a Odisseia juntamente com a Ilíada , duas das mais importantes obras da literatura ocidental, são-lhe atribuídas. Se resumíssemos as poucas mais de quatro centos de páginas (isso tomando a edição que tenho, a publicada pela Editora 34) diríamos tão somente que é a história de um homem que volta à sua casa depois de uma grande viagem. No território das suposições acredita-se que os dois textos homéricos sobreviveram à larga somente através da oralidade dos bardos até que fossem escritos.  Esse movimento da oralidade terá feito com que muito tenha se perdido e muito tenha se acrescentado? Evidentemente.

Espelho, espelho meu, de Tarsem Singh

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Por Pedro Fernandes O que seria de Espelho, espelho meu sem a rainha má de Julia Roberts? Talvez esse filme sirva como exemplar para uma coisa: espantar tédios. E só. E se só, já terá servido e muito. A ideia é benquista: voltar a um clássico popular coligido pelos Irmãos Grimm. A história todos já conhecem, inclusive a fala de efeito da rainha má - Espelho, espelho meu, existe alguém mais bela do que eu? Mas, como todo grande conto de fadas dispõe de uma maleabilidade textual tão forte só justificável pelo fato de ter sua base na oralidade, Tarsem Singh capricha em algumas subversões e reinaugura o texto de 1812*. Essa reinauguração, sim, me é benquista. Agora, a história contada pelo ponto de vista da rainha má, brilhantemente interpretada por Julia Roberts (aliás, o que seria do filme sem a presença dela?), merecia ao menos um desfecho outro e não a bizarrice anticerebral aí apresentada. Mas, fiquemos por aqui e voltemos mais tarde para falar melhor disso. Evidentemen

Um caderno para Saramago - atualizações

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Capa da edição de Lucerna , revista criada pela Fundação José Saramago. Em 2003, o escritor português numa de suas várias viagens ao Brasil, esteve na sede da TV Cultura para a gravação de uma participação no programa Roda Viva. Recentemente a emissora disponibilizou no seu canal no YouTube a versão integral dessa entrevista, que é o destaque das atualizações feitas no espaço-projeto Um caderno para Saramago. A entrevista pode ser vista acessando no menu Outros textos > Vídeos . Ainda no YouTube o projeto tem catalogado outros momentos em vídeos do escritor, tais como os vários depoimentos dados para documentários. Em breve, esses vídeos também integrarão aí os bancos de dados.  Novidades ainda no menu Notícias com destaque para o lançamento na próxima segunda-feira, Dia Mundial do Livro, da revista eletrônica da Fundação José Saramago, Lucerna.

A cidade textual e Fernando Pessoa

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Foto: Miguel Manso. "No prédio em que nasceu, com natural direito a placa comemorativa, vê-se a entrada para uma sociedade de advogados e o rés-do-chão é agora corrido a montras  deluxe  (Marc by Jacobs, por sinal). [...] Aqui, o poeta de bronze, obra do belga Jean-Michel Folon colocada no largo em 2008, está em pé no seu rasteiro pedestal mas não tem cabeça; ou melhor, a cabeça é um grande livro que tem escrito "Pessoa" na capa. Marina chama-lhe a estátua Facebook ."  (Trecho de "A aldeia de Pessoa era o coração de Lisboa", de Luís J. Santos, caderno Fugas Viagens , jornal Público ) Não foi Fernando Pessoa  o primeiro escritor a compor uma urbe de tinta e papel que vai se firmando ao mesmo tempo como espaço existente e ficcional. Tão longe onde eu possa alcançar no universo literário, a cidade é marca narrativa já desde a Odisseia , de Homero; no escritor grego, inclusive, é a cidade elemento determinante na identidade dos sujeitos. Lisboa, en

Escrever: inspiração ou talento?

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Mãos do escritor Jean Echenoz, 1987. Foto: Hannah Assouline. Lendo um artigo publicado no jornal espanhol El País no qual um grupo de escritores, entre eles Juan Gelman, refletem sobre a tarefa do escritor e oferecem algumas recomendações aos autores iniciantes e relembrando uma listinha de 10 conselhos de Carlos Drummond de Andrade editada pelo escritor Michel Laub a partir da crônica "A um jovem", me fiz a pergunta que colore esse post: Escrever é inspiração ou talento? Acho que os conselhos dados pelos escritores já são provas mais que suficientes de que nem uma coisa nem outra existem se não for o sujeito extremamente cuidadoso com a profissão. E escrever é uma profissão? Bom, isso é debate para outro post, mas adianto, se não se encara como profissão, logo logo você deve correr para construir essa imagem. O excesso de modéstia, negando-se escritor, só deve durar e servir de encanto ao público quando já todos enxergarem-no como tal. E não deve durar

Arquivos na web para se deliciar

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Por Pedro Fernandes  Tenho para mim que, para quem lê alguma coisa em Inglês ficará maravilhado com essa descoberta: a conceituada The Paris Review organizou um espaço em sua página eletrônica com entrevistas a escritores realizadas desde a década de 1950 a 2010 .  Por lá, encontram-se autores como T. S. Eliot, William Faulkner, Truman Capote, Ernest Hemingway, Jorge Luis Borges, Jean Cocteau, Saul Bellow, Jack Kerouac, Aldous Huxley, Ezra Pound, Vladimir Nabokov, Robert Fitzgerald, Elizabeth Bishop, Marguerite Yourcenar, Italo Calvino, José Saramago, entre outros. Já o jornal francês Le Monde , que publica um repasse biográfico da vida de Virginia Woolf (imagem) pelas mãos da escritora Virginie Despentes, apresenta uma gravação (reproduzida abaixo) em que se pode escutar a autora de Orlando falar como a língua inglesa do pós-guerra poderia libertar o pesadelo do passado.  Não custa lembrar que a Cosac Naify apresentará em breve uma edição caprichadíssima de seu famoso roma

labirinto

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se me calo me vencem se me rebelo eles lucram * Acesse  o e-book  Palavras de pedra e cal  e leia outros poemas de Pedro Fernandes.

Ler a Odisseia (Parte I)

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Por Pedro Fernandes Odisseia de Homero , Turner. Devo retornar à questão primeira que postei em Letras in.verso e re.verso quando dei início à leitura da Odisseia , de Homero. Daniel Mendelsohn em recente entrevista ao The Browser responde à questão posta dizendo: “Quando eu chegar a minha velhice, a resposta para isso é que os clássicos são apenas bons .” Vou na contramão de Mendelsohn para dizer que, devo ainda está longe da velhice se pensar na idade que tenho hoje, mas que, voltando agora, já prestes a fechar a leitura do livro de Homero para dizer isso: os clássicos são bons. E é, sem falsa modéstia, os únicos que ainda conseguem ajudar a esse leitor que venho construindo desde que me colocava diante da leitura da Bíblia à volta dos meus catorze anos.  Repete-se lendo a Odisseia o que vivi lendo Dom Quixote ou Grande sertão: veredas , para ficar apenas em dois exemplos. Quanto à leitura da Bíblia aos catorze,   fui precoce, então. A Bíblia é, juntamente com a Odisse

Wisława Szymborska

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Por Ruth Franklin A Polônia do pós-guerra era uma nação extraordinariamente miserável, mas num aspecto (e talvez esse fosse o único) estava entre as mais afortunadas do mundo. Este país sem pretensões, que não é admirado por suas paisagens, por sua gastronomia ou por sua arquitetura, produziu três dos melhores poetas europeus da última metade do século. O primeiro deles foi Czesław Miłosz (1911-2004), nascido na Lituânia numa família polonesa, depois fugiu para a França em 1951 e logo emigrou para os Estados Unidos na década 1960. Foi o poeta geopolítico, o que encaixava perfeitamente com sua condição de exilado, e o primeiro prêmio Nobel da Polônia. O segundo foi Zbigniew Herbert (1924-1998), o poeta filósofo da Polônia, quem se negou a colaborar com o regime comunista e escreveu sua lírica abstrata e inteligentíssima na penúria durante grande parte de sua vida. A última foi Wisława Szymborska (1923-2012). Embora fosse contemporânea de Herbert, a coloco no final não por

As melhores histórias de amor

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Por Pedro Fernandes Two in the hills.  Margarita Sikorskaia. Não vou com o papo piegas de que a melhor história de amor é aquela na qual o Criador traveste-se de criatura e deixa-se morrer na cruz pela libertação da humanidade do pecado. Mérito cristão, mas eis aí um motivo contraditório e difícil de engolir. Não creio nisso e, mesmo não sendo data (e há data para falar disso?) vou para histórias de amor mais terrenas e, portanto, mais verdadeiras que quaisquer invencionices ideológicas. A primeira que me levou às lágrimas foi Philomena Borge s, de Aluísio Azevedo. E posso dizer com um tanto de convicção que talvez tenha sido esse livrinho do naturalista brasileiro que li num dia – sem pausas para o almoço – o que me colocou definitivamente no território da Literatura. Sim, porque antes eu me reduzia aos policialescos da Agatha Christie e, logo depois desse romance, parti para outras obras como O cortiço , Casa de pensão e O mulato , todos do Aluísio, para seguir com

A poesia como arma

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Por Pedro Fernandes Guernica . Painel pintado por Pablo Picasso em 1937 para a Exposição Internacional de Paris. Símbolo da arte-denúncia, já que a tela é tratada como representativa dos bombardeios sofridos pela cidade espanhola de Guernica em abril daquele ano. Para o seu autor a pintura não existe para decorar casas, mas é um instrumento de guerra ofensivo e defensivo contra o inimigo. Insistentemente o primeiro nome que nos vem à cabeça quando se lê o título dado a esta post é o de Maiakóvski, assim como o primeiro nome que vem à cabeça para ilustrar um texto com esse título é o de Pablo Picasso e o seu famoso painel Guernica . Por isso dele lembramos, por isso a imagem acima. O poeta soviético talvez não tivesse a preocupação por elaborar uma estética fechada numa forma da arte pela arte, mas entendia que a arte deve comparecer ao seu tempo como se uma espécie ferramenta junto à revolução social. (É necessário que se preserve aqui todos os sentidos para o termo revoluç