A invenção de Hugo Cabret, de Martin Scorsese
Por Pedro Fernandes
Quando assisti ao trailer para A invenção de Hugo Cabret não entendi qual a razão de ser este um dos filmes mais cotados ao Oscar de 2012. Mas um nome na direção me intrigou: Martin Scorsese. Raros foram os filmes do cineasta que me decepcionaram; para falar verdade, nenhum. Alguns do início de carreira são um tanto monótonos, mas o enredo, por exemplo, é sempre muito bem arquitetado. Quando nasce-se para ser grande, é grande eternamente. Essa afirmativa que dou sobre Scorsese poderia ser estendida como tema central do filme aqui em questão. E, logo, entenderemos o porquê. Voltemos ao trailer. Parece ser efeito do gênero: antes de guiar o telespectador na escolha do filme o de não dizer muito (na grande maioria dos casos) sobre o que será exibido. Tenho visto trailers muito bons e que me deparo com o filme, é uma decepção só. Nesse caso, o efeito foi justamente o contrário.
Cena de A invenção de Hugo Cabret. Hugo (Asa Butterfield) e seu pai (Jude Law, em ponta para o filme) |
Quando assisti ao trailer para A invenção de Hugo Cabret não entendi qual a razão de ser este um dos filmes mais cotados ao Oscar de 2012. Mas um nome na direção me intrigou: Martin Scorsese. Raros foram os filmes do cineasta que me decepcionaram; para falar verdade, nenhum. Alguns do início de carreira são um tanto monótonos, mas o enredo, por exemplo, é sempre muito bem arquitetado. Quando nasce-se para ser grande, é grande eternamente. Essa afirmativa que dou sobre Scorsese poderia ser estendida como tema central do filme aqui em questão. E, logo, entenderemos o porquê. Voltemos ao trailer. Parece ser efeito do gênero: antes de guiar o telespectador na escolha do filme o de não dizer muito (na grande maioria dos casos) sobre o que será exibido. Tenho visto trailers muito bons e que me deparo com o filme, é uma decepção só. Nesse caso, o efeito foi justamente o contrário.
A invenção
de Hugo Cabret entra para o rol daqueles grandes filmes que aproveitam-se
de dois materiais: a história e a sua própria linguagem. Compõe-se, portanto,
como um longa que quer ser histórico, e é, mas também é pura
metalinguagem.
O filme é
uma adaptação do livro
homônimo, de 2007, do autor e ilustrador americano Brian Selznick. Hugo
Cabret é filho de um relojoeiro. A morte de seu pai num incêndio destina o
menino aos cuidados de um tio beberrão que vive por entre as paredes da estação
de trens parisiense Gare du Nord com o ofício de acertar os relógios do
edifício. Tão logo, também o tio desaparece e Hugo já de posse do ofício do pai
passa a cuidar secretamente das atividades do tio. Vive aí às custas de
pequenos furtos. Nessa atividade paralela, que não por opção, mas, claro está,
por necessidade, também rouba pequenas peças da loja de brinquedos de um
ranzinza senhor que, a certa altura, o pega em ação. O que o telespectador verá
a partir daqui é o retrato de uma persistência. Primeiro, a persistência de um
menino que luta pela vida dia-a-dia; segundo, a persistência pela liberdade,
afinal, todos os órfãos pedintes na estação são capturados para o orfanato como
numa espécie de limpeza geral do lugar; terceiro, a persistência por dar
"vida" a um autômato, figura metálica que tem estrutura interna
complexa movimentada por um conjunto de engrenagens e que põe ao ápice o
ilusionismo pela capacidade que tem de desempenhar determinadas atividades humanas
para as quais são programadas (espécie, portanto, de pré-robô). O autômato aqui
é herança do pai e foi adquirido de um museu em Paris.
Ilustração de Brian Selznick para o seu livro A invenção de Hugo Cabret, obra na qual se apoia o filme de Scorsese |
O concerto
dessa máquina terá duas funções extremas para o desenvolvimento do filme: uma,
é a descoberta da real identidade do vendedor da loja de brinquedos da qual
Hugo furta-lhe objetos para a aquisição de peças na reconstrução do autômato;
outra, é a possibilidade de nova vida para o menino. A função do autômato aí é
capacidade de escrita e de desenho. Uma vez concertado, o aparelho desenha uma
clássica cena de Viagem à lua, do cineasta Georges Méliès. O desenho
levará Hugo, agora já amigo da sobrinha do vendedor de brinquedos na busca pela
mensagem nele contida. Parêntese seja feito aqui para destacar o poder do livro
e da leitura - que parece ser a história outra costurada por baixo dessa,
afinal o próprio filme (disso já sabemos) tem num livro sua origem. Há a
sobrinha do vendedor de brinquedos, que sob o regime rígido do tio, consegue
transpor o mundo no qual vive pela capacidade de fantasia construída a partir
dos livros que lê. Depois, é a visita à majestosa biblioteca de Paris à cata de
saber mais sobre o cinema que levam os dois meninos a descobrirem, primeiro,
Georges Méliès e então a mensagem desenhada pelo autômato e, segundo, um
contato com um pesquisador apaixonado pela obra do cineasta.
Sabendo que
Georges Méliès é o vendedor de brinquedos, o que a partir daqui se desenvolve,
é a inserção (como por homenagem de Scorsese ao cinema) do reconhecimento do
cineasta, como aquele que, de fato, depois da invenção dos irmãos Lumière, foi
capaz de potencializar o cinema como uma espaço da fantasia e da possibilidade
do sonho.
O filme de
Scorsese logo se assume nos dois principais movimentos que gestou o cinema:
além de reconhecer a fantasia (Méliès) recupera ainda capacidade do cinema em
captar a realidade e transmutá-la, real propósito dos irmãos Lumière.
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