Chema Madoz, esvaziamento e reapropriação poética
O contato com a obra de Chema
Madoz se deu ao acaso. O fotógrafo, um dos mais respeitados nomes em Espanha e
com trabalhos editados e expostos em meio mundo, ainda é novidade a muitos
olhares brasileiros. Eu, nunca fui entendedor de fotografia, mas os trabalhos
de Chema me fizeram sair à cata de trabalhos de outros fotógrafos. Encontrei-me
virtualmente com muitos que espero ter a chance de publicá-los em trabalhos
posteriores que eu venha editar.
Agora, voltando ao contato
primitivo com a obra de Chema. Ele se deu quando eu estava à cata de imagens
que pudesse ilustrar o conjunto de dois ensaios que saem agora na 3.ª edição do
caderno-revista 7faces. Depois da primeira fotografia, dei com uma
quantidade de imagens que, dialogavam, plenamente com aquilo que discutia os
dois ensaios em questão. A única atitude que tive foi a de, usando meu
portunhol, entrar em contato com o fotógrafo espanhol a fim de pedir o uso de
pelo menos dez dos seus trabalhos. E, prontamente, fui atendido.
E depois de breve troca de curtos e-mails, Chema me permitiu o uso das imagens.
Ao todo são dez, que abrem e fecham esta edição.
A fotografia de Chema Madoz
obedece a um padrão único e adquire um status que beira a dois
estágios – o da perfeição e o do poético. Sua técnica consiste em deslocar
objetos do seu contexto de origem e, usando de algumas operações estéticas,
ressignificá-los. Traço de natureza surrealista. Com isso, Madoz, esvazia-os do sentido comum e insere no
objeto um conjunto de significações recuperadas aos olhos do expectador pela
retina da história e da memória. Estão ao seu serviço, além da manipulação da
imagem, a transposição dela para outro contexto. Quer ele dizer, contar, no
mínimo duas coisas: primeiro, a restituição do valor do objeto, seria a visão
mais superficial que tiraríamos daí. O abandono do objeto é, em si, já uma
destituição, que perde tais contornos à medida que levado para outro meio.
Nesse meio, ele é novamente destituído pela intervenção plástica operada pelo
fotógrafo e ganha enfim uma restituição de um sentido que é o mesmo e outro
simultaneamente.
Segundo, e esta parece ser a mais
adequada interpretação, porque diz respeito ao significado obtido com o produto
final, é a apresentação da ideia de que a história do mundo está contida nas
pequenas coisas. Nas mais insignificantes talvez. Basta que o nosso olhar seja
invertido para outro ângulo. E aqui reside o caráter poético desse estágio. Ao
instaurar um olhar outro para comum, Madoz recupera o status de
encimesmar-se do poeta. A surpresa para o sutil, para o detalhe do corriqueiro,
é onde reside o estágio da poesia. Estou dizendo isso e pensando nos famosos
versos de Carlos Drummond de Andrade – “tinha uma pedra no meio caminho / no
meio do caminho tinha uma pedra” – em que a poesia se instaura no impasse, na
pedra como obstrução. Da pedra insignificante ao elemento de importância que
ela ocupa ao olho do poeta.
Ao transpor os objetos de um
universo a outro, Madoz ergue para si um mundo todo de metáfora e por que não
alegórico. Os objetos assim deslocados adquirem uma imagem que não quer dizer
necessariamente aquilo que a superfície dela mostra, mas quer dizer outra
coisa. Tem aí também nesse impasse de sentidos, uma percepção crítica do espaço
no qual ele se inscreve. Digo isso porque das fotos em que vi a presença do
corpo humano, ele se apresenta em partes, e destituído da forma corpórea:
objetificado. E aí, claramente, o fotógrafo espanhol inscreve o corpo como
objeto, destituído de ânima, como parecem os sujeitos contemporâneos, numa clara
crítica ao individualismo e à exposição exagerada do corpo.
É evidente, que por tudo isso, o
trabalho de Chema Madoz é de uma grandeza única e carece de uma análise mais
acurada, coisa que esse curto espaço aqui não permite. Fiquemos, então com as
observações primitivas minhas e o leitor tire suas conclusões diante do
trabalho do fotógrafo que vem nas páginas da nova edição do
caderno-revista 7faces.
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No Canal Letras in.verso e
re.verso no YouTube é possível ver
um vídeo de apresentação de Chema Madoz. Nele, o fotógrafo espanhol
fala sobre seu trabalho, o sentido do seu trabalho e sobre a vida. Vale a pena
assistir.
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