Miacontear - O peixe e o homem
Por Pedro Fernandes
“O peixe e o homem” reitera a linha do fantástico notada em outros contos de O fio das missangas, como “O homem cadente”. Retomando uma passagem do famoso sermão do Padre António Vieira - “O sermão de Santo António aos peixes” - colocada como epígrafe do conto, a narrador de Mia Couto, no tom de uma anedota daquelas de pescador, dá corda à história da mania do estranho Jossinaldo.
Jossinaldo é um vizinho que tem a também estranha mania de passear de trela com um peixe. Fato que por si o coloca na galeria daqueles sujeitos deslocados do espaço comum - “Jossinaldo era, nos gerais, tido por enjeitado: a cabeça do coitado, diziam, cabia toda num chapéu. E acresce-se que o temiam, sem outro fundamento que essa estranheza do seu fazer.”
Não se sentindo bem de saúde, o excepcional homem vem ter com o narrador para que ele, de agora em diante, passe a tomar conta do peixe de estimação. Isso desencadeará uma troca de lugar capaz de ressignificar sua própria existência.
O movimento de inversão é ensaiado em outros contos de O fio das missangas reafirmando a ideia de movência das subjetividades e redesenho das identidades. Afinal, parece que estamos, nesse livro, num território de miscigenações, enraizamentos e desenraizamentos e movências de sujeitos.
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“Minha sabedoria é ignorar as minhas originais certezas. O que interessa não é a língua materna, mas aquela que falamos mesmo antes de nascer.”
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“Dentro de mim, vão nascendo palavras líquidas, num idioma que desconheço e me vai inundado todo inteiro.”
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