Um dia de chuva, de Eça de Queiroz
Por Pedro Fernandes
Trata-se de um achado do escritor português. Assim se anuncia pela editora o que agora se publica. Trata-se de um conto que ganha sua primeira edição independente em livro. E vem alagado (para usar um termo afluente da ideia-chuva) por um conjunto de 15 ilustrações do desenhista Eloar Guazzelli. Um dia de chuva é uma pequena obra-prima, assim opina o professor Antonio Candido, quem escreve a quarta capa da edição.
"O enredo é simples e aponta para uma singela história de amor, encoberta por uma chuva incessante. Escrito perto de sua morte, o autor deixou o texto por terminar, e este aspecto de inacabado é um traço de modernidade que só faz enriquecer sua leitura.
Na história, José Ernesto, um solteirão que mora em Lisboa, vai até uma cidade do Norte de Portugal com o intuito de comprar uma quinta, para fugir da cidade grande. Ao chegar, sucedem-se vários dias de chuva incessante, em que o protagonista conversa com o padre da paróquia local, que também é procurador dos donos da casa, e com o caseiro.
Impossibilitado de conhecer a quinta, José Ernesto ouve ao redor de uma boa mesa, ao sabor das iguarias rurais e do vinho, o padre contar as vantagens do terreno e a história da família que habitava a casa. É então que ouve falar de D. Joana, filha do proprietário, por quem se apaixona mesmo antes de conhecê-la. A chuva permeia o conto e define seus limites, criando uma espécie de cortina através da qual enxergamos, junto com José Ernesto, a casa com seus cômodos, corredores e memórias da família que ali habitava." - assim justifica a apresentação do livro feita para o site da editora Cosac Naify, a que edita a obra.
Se o texto conduz o leitor ao ambiente exterior, marcado pela água torrencial, as ilustrações de Guazzelli criam a atmosfera romântica que se forma, gradativamente, entre José Ernesto e a filha do proprietário, priorizando o interior do casarão do século XVI.
Sobre esse trabalho de ilustração da obra, o próprio ilustrador comenta em nota publicada no blog da Cosac Naify como se deu o processo: "Desenhar o pouco conhecido Um dia de chuva representou, para mim, um exercício extraordinário de articulação de opostos: o contraponto entre um ambiente externo chuvoso, sempre indefinido, quase abstrato, e o caráter sólido e imutável do interior da quinta. A atmosfera de refúgio que pouco a pouco envolveu o protagonista me atraiu. Era como se, a cada desenho, essa sedução acontecesse da mesma forma em mim. Quando o clima melhora e a ação se desloca para o exterior da casa, o meu traço também se liberta, ganhando formas e contornos mais suaves."
O conto é publicado agora graças a Antonio Candido, lembra Augusto Massi, consultor para a edição. "O estalo para o projeto de Um dia de chuva ocorreu com a leitura do ensaio de Antonio Candido 'Eça de Queiroz passado e presente', publicado em Eça do Brasil, organizado por Benjamin Abdala Jr. (Senac, 2000).
Após traçar um excelente panorama da recepção crítica do escritor português no país, Antonio Candido revisita sua progressiva admiração pela obra do romancista. E, só lá no finzinho do ensaio, ao falar dos 'encantos do inacabado', ele derrama seu olhar sobre Um dia de chuva. Em apenas duas páginas estão sintetizadas todas as habilidades do grande crítico. Diante da vasta obra de Eça, ele discretamente chama nossa atenção para uma breve narrativa que o próprio autor deixou inacabada. Realizada a leitura, não tive dúvidas: tratava-se de uma pequena obra-prima", afirma em texto a ser publicado no Estado de Minas.
Comentários
Um beijo
Carmen.