Rachel de Queiroz
Primeira mulher a ingressar na Academia Brasileira de Letras. O ano que finda marcou o centenário de nascimento da escritora nascida em Fortaleza (CE). Quando Rachel de Queiroz se estreia na literatura com o seu romance O quinze, em 1930, já a seca do sertão nordestino figurava enquanto elemento na ficção. O fato é Rachel não apenas ambienta a seca, mas faz dela tema e persona na sua obra. Além do que ela inaugura, como faz todo grande escritor, um estilo próprio. Dona de uma prosa árida, despojada, o avesso completo das possibilidades que se vinham sendo experimentadas nos territórios de escrita de sua época, Rachel de Queiroz está situada no início de um dos movimentos mais ricos de nossa literatura - o movimento regionalista.
Além romancista, Rachel foi cronista e dramaturga, sendo desta última profissão textos como Lampião (1953) e A beata Maria do Egito (1958). Depois de poemas esparsos publicados em livros diversos, recente descobre-se que também compôs livros do gênero muito antes de sua estreia como cronista e romancista: Mandacaru, cuja edição foi organizada pela pesquisadora Elvia Bezerra e publicada pelo Instituto Moreira Salles, e Serenatas, organizada pela escritora Ana Miranda e publicada pelo Armazém da Cultura. Ambas publicações vêm revelar um estágio de formação da Rachel-romancista, que mais tarde reagiria com ironia ao ser chamada de poeta: o primeiro é um conjunto com dez poemas carregados na cor local e na exaltação de figuras nordestinas, que Rachel tentou sem sucesso editar em livro; e o segundo, mais lírico, reúne mais de 40 poemas, muitos deles publicados pela jovem escritora em jornais do Ceará sob o pseudônimo Rita de Queluz.
Glória Pires em cena da adaptação do romance Memorial de Maria Moura, uma das obras de Rachel de Queiroz adaptadas para a TV. |
Na produção romanesca da escritora é possível de citar ainda, além do já referido romance de estréia, Caminhos de pedras (1937), As três Marias (1939) Dôra Doralina (1975) e Memorial de Maria Moura (1992). Numa entrevista que a escritora deu ao fechar os noventa anos chegou a afirmar que nunca gostou de escrever e sempre o fez para se sustentar, começando já desde os 19 anos. Modéstia de escritora ou não, o fato é que Rachel de Queiroz deixou, para a produção literária brasileira, uma escrita que como sua obra é significativa recompondo rumos e trajetos para a construção de nossas letras.
O romance de 1992 veio a lume quando a escritora tinha 82 anos e foi surpresa para crítica e os leitores. Não era apenas a obra que colocava um ponto final na carreira que a consagrou, mas uma verdadeira síntese da obra realizada em mais de seis décadas. "Tudo está ali, como se Os Sertões de Euclides da Cunha se tornassem matéria romanesca: a força da terra, o sofrimento do homem, a brutalidade da luta. Se, na Conceição de O Quinze e na Guta de As três Marias, já usara um pouco de si, em Maria Moura a romancista se põe toda, com a experiência e o saber que lhe dera a vida", diz Edimílson Caminha.
Tanta dedicação às letras não foi construída do dia para noite. Rachel foi criada entre livros, como ela própria lembrou várias vezes: a biblioteca da mãe reunia perto de cinco mil volumes, parte deles importados de Paris. E sua estreia com a escrita pública se dá três anos antes da publicação de O Quinze. É quando sob pseudônimo Rita de Queluz ela se inicia na imprensa. Colabora com o jornal O Ceará, de Fortaleza. E do gênero suspeita-se que tenha escrito mais de três mil textos espalhados em periódicos como Correio da manhã, Última hora e a revista O Cruzeiro (isso no Rio de Janeiro), mas Rachel publicou ainda em jornais de Recife, Belo Horizonte e São Paulo.
Além da extensa atividade como autora, Rachel de Queiroz publicou textos em coautoria irmã Maria Luíza (Tantos Anos / 1998, O Não Me Deixes: suas histórias e sua cozinha / 2000, Magno / 2007), Aníbal Machado (Brandão entre o mar e amor / 1942), com Aníbal Machado, Graciliano Ramos, Jorge Amado e José Lins do Rego (O mistério dos MMM / 1962), com Antonio Callado, Dinah Silveira de Queiroz, Guimarães Rosa, Herberto Sales, Jorge Amado, José Condé, Lúcio Cardoso, Orígenes Lessa e Viriato Correia.
Enfim, Rachel deixou inscrito e (muito bem inscrito) seu nome na cena da literatura brasileira. Fez uma obra indispensável de ser lida por todo leitor.
Ligações a esta post:
Mandacaru, o inédito de Rachel de Queiroz, aqui.
Ainda Rachel de Queiroz, O não me deixes, aqui.
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