Na escrita, alguns empecilhos, pedras, pedregulhos no caminho
Por Pedro Fernandes
E são muitos. Os empecilhos, as pedras e os pedregulhos. Mas dizem que com eles é que se constrói tudo. Vamos ver. Ainda não tem cara de gente, mas já é um embrião o que ainda chamo de ensaio acadêmico, matéria para a concretização do estudo cunhado para a dissertação de mestrado.
A pesquisa, entretanto, parece haver encalhado num lugar algures que ainda não consegui precisar seriamente qual é. Um massapê. Talvez seja apenas uma dessas falhas capazes de nos acometer durante o gesto da escrita, sempre identificada como um processo um tanto doloroso. Além disso, a rotina que mantinha de escrever (sim, a escrita é uma tarefa que exige de quem a executa uma rotina) esteve baldeada por outras obrigações.
Pensar nunca é coisa barata e exige foco e determinação porque sempre a caminhada lenta e o tempo é curto - ou seja, estamos lidando com linhas de força opostas. E a única solução já experimentada por outros e agora por mim é de dá espaço para que o próprio itinerário se decida apresentar uma curva, uma forma, ou até um itinerário outro a fim de que o pesquisador saia do atoleiro.
Significa ir cuidar de outras obrigações? Também. Mas, não muito afastadas do ofício. Ler, para os casos de pesquisa bibliográfica, é sempre uma condição energizante nessas horas. Nela, na leitura, é onde está algumas peças capazes de por o pé no chão seco ou erguer ideias com os empecilhos, as pedras e os pedregulhos.
Isto é, eles aí estão, no meio do caminho para superação. A necessidade para vencer (não gosto da palavra, porque isso não é uma competição, mas vá lá, é a que tem para o gasto) é também a de ter paciência. Se se remenda gestos na pressa vem o risco de que apareçam rasgados logo depois do cerzido. É o destino de quem está na lida com palavras, esse exercício refletido já de tantas maneiras pela própria literatura. Nessas horas, é que cabe bem um poema de Carlos Drummond de Andrade, construído como se uma sutil receita para o sujeito das palavras; chama-se "Procura da poesia" e está no livro A rosa do povo. Fica o recorte de uma parte abaixo:
Penetra surdamente no reino das palavras.
Lá estão os poemas que esperam ser escritos.
Estão paralisados, mas não há desespero,
há calma e frescura na superfície intata.
Ei-los sós e mudos, em estado de dicionário.
Convive com teus poemas, antes de escrevê-los.
Tem paciência, se obscuros. Calma, se te provocam.
Espera que cada um se realize e consume
com seu poder de palavra
e seu poder de silêncio.
Não forces o poema a desprender-se do limbo.
Não colhas no chão o poema que se perdeu.
Não adules o poema. Aceita-o
como ele aceitará sua forma definitiva e concentrada
no espaço.
Chega mais perto e contempla as palavras.
Cada uma
tem mil faces secretas sob a face neutra
e te pergunta, sem interesse pela resposta,
pobre ou terrível que lhe deres:
Trouxeste a chave?
A pesquisa, entretanto, parece haver encalhado num lugar algures que ainda não consegui precisar seriamente qual é. Um massapê. Talvez seja apenas uma dessas falhas capazes de nos acometer durante o gesto da escrita, sempre identificada como um processo um tanto doloroso. Além disso, a rotina que mantinha de escrever (sim, a escrita é uma tarefa que exige de quem a executa uma rotina) esteve baldeada por outras obrigações.
Pensar nunca é coisa barata e exige foco e determinação porque sempre a caminhada lenta e o tempo é curto - ou seja, estamos lidando com linhas de força opostas. E a única solução já experimentada por outros e agora por mim é de dá espaço para que o próprio itinerário se decida apresentar uma curva, uma forma, ou até um itinerário outro a fim de que o pesquisador saia do atoleiro.
Significa ir cuidar de outras obrigações? Também. Mas, não muito afastadas do ofício. Ler, para os casos de pesquisa bibliográfica, é sempre uma condição energizante nessas horas. Nela, na leitura, é onde está algumas peças capazes de por o pé no chão seco ou erguer ideias com os empecilhos, as pedras e os pedregulhos.
Isto é, eles aí estão, no meio do caminho para superação. A necessidade para vencer (não gosto da palavra, porque isso não é uma competição, mas vá lá, é a que tem para o gasto) é também a de ter paciência. Se se remenda gestos na pressa vem o risco de que apareçam rasgados logo depois do cerzido. É o destino de quem está na lida com palavras, esse exercício refletido já de tantas maneiras pela própria literatura. Nessas horas, é que cabe bem um poema de Carlos Drummond de Andrade, construído como se uma sutil receita para o sujeito das palavras; chama-se "Procura da poesia" e está no livro A rosa do povo. Fica o recorte de uma parte abaixo:
Penetra surdamente no reino das palavras.
Lá estão os poemas que esperam ser escritos.
Estão paralisados, mas não há desespero,
há calma e frescura na superfície intata.
Ei-los sós e mudos, em estado de dicionário.
Convive com teus poemas, antes de escrevê-los.
Tem paciência, se obscuros. Calma, se te provocam.
Espera que cada um se realize e consume
com seu poder de palavra
e seu poder de silêncio.
Não forces o poema a desprender-se do limbo.
Não colhas no chão o poema que se perdeu.
Não adules o poema. Aceita-o
como ele aceitará sua forma definitiva e concentrada
no espaço.
Chega mais perto e contempla as palavras.
Cada uma
tem mil faces secretas sob a face neutra
e te pergunta, sem interesse pela resposta,
pobre ou terrível que lhe deres:
Trouxeste a chave?
A "receita" é para o poeta, mas tem a mesma valia para o pesquisador, sobretudo, o que tem na palavra alheia seu campo de perscrutação. Afinal, independe do gênero: escrever reveste-se de uma mesma força de gestos e alimenta-se de inquietações muito próximas. O esperado é está sempre armado com a chave certa, porque estas, no rol dos empecilhos, pedras e pedregulhos, também são muitas.
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