A origem, de Christopher Nolan

Por Pedro Fernandes

Caprio em grande forma em A origem, isso depois de uma outra estreia singular no cinema, Ilha do medo, de Martin Scorcese


Até hoje Ilha do medo, de Scorcese era, para mim, o melhor filme de 2010. Perdeu seu posto para A origem, de Christopher Nolan. O filme é primoroso e retoma no espectador seu estágio de inteligência constantemente solavancado por bestiliades que varrem as telas do cinema de cabo a rabo no mundo. O enredo é simples; pode ser resumido em poucas linhas. Um ladrão de sonhos, Dom Cobb (Leonardo DiCaprio) é contratado para plantar uma ideia no inconsciente de um homem. Pronto está feito o nascimento de um enredo labiríntico e complexo que exige de nós olhos abertos a cada virar de cena.

Misto de sonho e realidade, o filme se apodera de questões caras à psicanálise, à física, à filosofia e sobre a própria técnica do fazer cinema. Para Nolan isso tudo posto à prova não é novidade. O diretor vem aperfeiçoando sua técnica de manipulação dos laços ficção-realidade, desde quando lança Amnésia - filme também guiado pelas linhas da mente, e Seguinte - seu primeiro filme levado à cena há pelo menos uma década. A tessitura labiríntica de A origem não foi-lhe barata. Segundo os jornais sobre cinema, Nolan teria levado nada menos do que dez anos para elaborar a trama.

O filme me lembrou Ilha do medo. Em ambos os filmes a realidade são projeções da mente humana, e difícil é precisar onde que finda uma e onde que começa outra. Fez-me lembrar ainda Matrix pela operacionalização dos labirintos cerebrais como que máquinas potentes capazes de erguer nosso estágio de civilização e capazes também de destruí-los. Lembro aqui da personagem-mulher fatal - a mulher de Dom, interpretada pela atriz Marion Cotillard. Ela morreu, mas vive invadindo os sonhos do ex-marido. Espécie de vírus que se lhes apresenta em todos os projetos de invasão de sonhos para sujar o roteiro elaborado.

Tudo nesse filme vale a pena: a trilha sonora - que novamente me remete ao Ilha do medo, claro, aqui pincelado pelos versos da Edith Piaf em Non, je ne regrette rien, que é a música usada para acordar do transe os envolvidos no projeto de manipulação dos espaços oníricos - a fotografia, os efeitos - que novamente me remete ao Matrix. Enfim, como já bem notou a crítica, A origem reitera que, apesar de tudo, ainda reside inteligência em Hollywood.


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