Um Jesus na Playboy
Por Pedro Fernandes
O título desta post se refere a homenagem - ou não sei o quê - que a Playboy portuguesa (foto da capa, acima) inventou de reservar, na edição deste mês, ao escritor José Saramago. Por esta capa - aliás, de gosto duvidoso - se vê um Jesus recebendo nos braços uma mulher seminua, como se uma Madalena, numa espécie de releitura da Pietà. A revista traz uma reprise da entrevista feita ao escritor em 1995 e publicada na edição brasileira. Toda a entrevista segue ilustrada por ensaio fotográfico em que Jesus está em meio a mulheres seminuas em várias situações.
Se isso era uma homenagem acho que o tiro saiu pela culatra. Particularmente não simpatizei com a ideia e vejo nela muito mais um oportunismo gratuito no uso da imagem do escritor que homenagem. Não se trata essa opinião aqui de uma visão cristã; pela religião - se talvez fosse esse o pretexto da Playboy, aproveitando que mexer no sagrado está na moda e dá ibope - eu até entendo. E sou mesmo de acordo com a capa. Assim como entendo e sou de acordo que o interesse da revista seja o que ela alegou em sua defesa: a crítica acerca da condição feminina - esta, fruto seja da construção histórica, fruto seja do próprio catolicismo, que são, conjuntamente, posso assim dizer, dois grandes empreendedorismos que tentam ainda a certo custo preservar certas posições servis do feminino em relação ao homem. Desse ponto de vista, repito, entendo e vejo com bons olhos a ideia.
Mas, em se tratando de José Saramago, a coisa muda; o ponto de vista é outro. Quando Saramago escreve O Evangelho segundo Jesus Cristo - obra que gerou em torno da sua figura toda a querela com a Igreja e o Estado português, querela já de todos conhecida, o escritor não está preocupado em atingir diretamente determinadas imagens já postas como verdadeiras, mas antes de questionar tais imagens e propor uma discussão sobre aquilo que, geralmente, não se é discutido. Há, portanto, uma diferença bastante significativa em ambos os propósitos. Se O Evangelho de Saramago escandalizou - não era esse seu único propósito. Fato que, na Playboy, vê-se claramente com um propósito a afronta.
Agora, também acho uma sacanagem ter sido fechada a filial portuguesa por esse simples fato. Ainda que a coisa não tenha agradado a todos - sabe-se já que, nem tudo agrada a todo mundo; que o diga esse Jesus da Playboy; maricas demais para meu gosto.
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