Sobre a poesia


Por Adélia Prado



Quando eu falo de poesia, não é apenas da poesia que, eventualmente, nem sempre nós encontramos nos poemas; falo do fenômeno poético de natureza epifânica, reveladora, daquilo que confere a uma obra de arte o estatuto de obra de arte. Poder ser música, pode ser escultura, a pintura, teatro, dança, cinema e literatura, que é onde eu me coloco. Tudo isso que foi nomeado, tudo aquilo que eu chamo de arte se justifica pela poesia que ela contém; se não tiver poesia não é cinema, não é teatro, não é pintura, não é literatura. Não tendo, ela é tudo, menos obra de arte. A obra verdadeira ela é sempre nova. Não cansa porque traz em si mesma e apesar de si mesma algo que não lhe pertence e nem pertence ao seu autor. Vem de outro lugar, de uma instância mais alta e através da única via possível, que é a vida da beleza. Em arte, quando eu falo beleza, eu tô falando não de boniteza, mas de forma. Arte é forma; não é do bonito que nós estamos falando. A forma, a beleza, revela o ser das coisas. É muito estranho falar do ser das coisas. Esse ser, ele é inapreensível. Eu não dou conta de pegar o ser de uma rosa, de um rio de uma paisagem ou de um rosto. Mas quando a arte faz isso, ela apreende, essa coisa mais alta que está atrás das coisas. Ela nos revela, nos remete a beleza suprema, se nós tivermos despidos do orgulho da razão e da lógica. Então, para que esse fenômeno de revelação da arte possa acontecer, nós temos que está desnudos de todo orgulho. A razão tem que abrir mão de seu poder, a lógica tem que abrir mão de seu poder, para que a obra possa ser apreendida no único lugar para o qual ela quer ir, que é o centro da pessoa, aquilo que nós chamamos o sentimento, os nossos afetos, aquilo que nos constitui felizes ou infelizes. Não é o que nós sabemos, mas é o que nós sentimos. Arte é para o sentimento, é para a sensibilidade, é para a inteligência do coração e não para a nossa inteligência lógica. São Tomás de Aquino, que falou sobre tudo nas suas súmulas teológicas, na sua obra filosófica, ele disse: "Todo ser é belo. Se alguma coisa é, ela é bela." E a arte revela o ser. E toda obra é necessariamente bela. Ela tem o jeito belo de mostrar até a feiúra. É por isso que uma obra verdadeira retratando alguma coisa horrível e asquerosa pode nos mover a ter aquela obra na parede, o ter em casa, ou comprar o livro, ou comprar o disco. Porque a beleza do ser, ela é irretocável, seja de que forma esse ser se apresente. Porque a beleza da arte, sendo beleza da forma, ela não é assunto. A gente faz muito esse equívoco: a arte é assunto, o enredo da novela, o enredo do romance, aquilo que a poesia está falando, não é isso que é a beleza. Não é o que está sendo dito, mas como está sendo dito; não é a coisa, mas como ela se mostra através da mão do criador. É isso que nós chamamos forma: não é o que está se mostrando, mas como se mostra. Se não fosse assim, guerras, execuções, moribundos, enchentes, todo o tipo de catástrofe, não podia ser retratado pelo artista, porque não é coisa bonita, não é coisa que se pode aparecer num salão. E no entanto a obra, a arte fala de absolutamente tudo, porque qualquer coisa é a casa da poesia. Ela não escolhe tema, nem enredo, nem assunto. Ela pousa onde lhe apraz. E é esse o momento em que é apreendido pelo poeta ou pela cineasta, enfim, pelo homem criador.

Agora nós podemos perguntar: por que que esse fenômeno nos humaniza? por que que arte nos humaniza? Porque mostra não aparência, que já está na natureza, a coisa já está aí pra nós, mas nos induz, por causa da emoção que ela nos causa, ela nos induz a intimidade, a alma das coisas, a nossa própria intimidade. E é por isso que ela nos comove, porque mexe não em nossos pensamentos, mas em nossos afetos, naquilo que nós sentimos. E me oferece, toda obra me oferece um espelho. A obra é um espelho. Ela me faz com que eu me reconheça nela, naquilo que eu estou vendo. Se você diante de um livro, de uma pintura, de um poema, fala: "Meu Deus, mas como esse autor pode tocar nisso?" Eu achava que só eu sentia isso, só eu sabia disso, aí que está nosso equívoco, aí mora a universalidade da obra verdadeira. Qualquer obra, feita na China, no Japão, no Canadá, no Brasil, verdadeira, ela tem o dom de espelhar a humanidade, aquilo que nos é comum. E nada mais comum em nós do que nosso desejo e do que nossos afetos. Queremos ser felizes, temos medo, temos compaixão, temos ódio, temos ira, temos bondade, todas as más e boas paixões que nos habitam. É esse material que faz a obra de arte. Ela não é um pensamento filosófico, ela expressa aquilo que nós sentimos, aquilo que é humano. E só por isso ela me alimenta, porque ela dá significação e sentido na minha vida. Isso é muito interessante. Que nós todos padecemos de uma angústia, uma angústia imensa, a criancinha pequena já padece dessa angústia, uma das primeiras angústias humanas, que é a angústia do tempo, da finitude, nós começamos e acabamos, somos finitos, nós passamos. E a obra, a obra de arte ela não sofre esse desgaste, ela está fora do tempo. Uma emoção muito profunda que você teve, uma paisagem muito bela que você viu, qualquer coisa que te comoveu, comoveu e passou, mas quando aquilo é apreendido ou num quadro, ou numa poesia, qualquer forma de arte, essa obra segura o tempo pra mim. Eu falo: Ai! Graças a Deus que tenho isso pra eu me lembrar. E tem mais uma coisa: ela não apenas segura o tempo, mas ela tem uma qualidade, que nós perseguimos sempre, que é a unidade de nosso ser, a unidade da nossa experiência. Que nós vivemos de maneira fragmentada. Quantas coisa nós já fizemos hoje? Tudo fragmentado. Uma hora toma é tomar café, uma hora é tomar banho, uma hora é se vestir, outra hora é encontrar com as pessoas, tem fragmentos de tempo. E nós queremos uma coisa eterna, unidade, que dure, que perdure e que não sofra essa solução de continuidade. Então a coisa mais próxima disso que nós temos enquanto estamos vivos é a arte. Você contempla um quadro, escuta uma música, aquilo está inteiro, inteiro. E porque está inteiro, ele me dá sentido, me dá um eixo, me dá alegria. A arte consola, conforta, é pão espiritual. Há uma fome em nós que nenhuma prosperidade material, que nenhum sucesso material pode saciar; você continua faminto, faminto de transcendência. Há algo que me diz: Você é mais que seu corpo, você é mais do que suas necessidades básicas, você é mais do que essa coisa quantitativa, tal peso, tal cor, tal idade. Você é aquilo que está presente no seu desejo, no seu sentimento, na sua alma. Então eu falo: Mas que bom que tem isso! A gente ver pessoas, por exemplo, que não dão conta, que não são capazes, por uma série de motivos, ou que nem pensam nisso, em articular esse desejo. Só falam assim: Mas que coisa boa que tem isso! Que filme bom! Que bom que tem esse filme! Que bom que tem essa música! Que bom que existe esse livro! Porque esse livro dá pra mim isso que eu tô buscando. Olha: tem algo mais nos acenando. E nos acenando de onde? Não é a religião que inventou, não é a filosofia que inventou, está acenando de dentro de nosso próprio ser. É o desejo profundo que nós experimentamos. Na nossa orfandade original - nós já nascemos órfãos - de ter sentido na vida, de ter significado e de ter perenidade - não pode acabar! - esse é o desejo que nós temos. Isso tudo significa - a pessoa que tem essa experiência, que tem esse desejo, nós dizemos, é uma pessoa que tem vida interior. Vida simbólica. Nós podemos dissecar um corpo, abrir um cadáver, que nós não vamos achar onde que está isso. Mas essa pessoa viva nos diria desse desejo, desse sentimento, capacidade de sofrer, de ter frustrações, dores profundas, depressões indescritíveis, e alegrias indescritíveis também. De onde vem isso? De onde nasce isso, a não ser da própria profundidade de nossa alma e de nosso sentimento. Então a arte nasce daí e produz a partir daí. Não adianta eu falar: Agora vou fazer um livro maravilhoso sobre isso, sobre aquilo. Não acontece. Porque a gente, a gente, eu digo, o autor não tem poder sobre a sua obra nesse sentido. Ela lhe é dada, lhe é oferecida como um dom, para o deleite, para a alegria de toda a comunidade humana. Imagine nós sem isso. A pobreza de viver lutando pela comida, pela roupa, pelo emprego, pela casa. Nós somos mais que isso. É como o sentimento do pudor. O pudor é exatamente o sentimento de que diz, "você é mais que seu próprio corpo". É por isso que temos vergonha. E quando a gente procura a arte, é tão maravilhoso isso, porque sem saber e sem querer, nós estamos procurando as coisas espirituais: a natureza divina. Divina e espirituais porque dizem respeito aquilo que não tem peso, nem tempo, nem medida, mas que sem isso a gente está regredindo a pura barbárie. Nós nos tornaremos bárbaros. Então a arte, nesse sentido, ela consola, conforta, alegra. E às vezes com muito choro. Há obras que nos deixam prostrados. E falam sobre o quê? As vezes sobre nada. Tem um poema, que é impossível não falar dele, que é um poema do Drummond, se chama "Tarde de Maio"; é um dos poemas mais maravilhosos, pra mim, que Drummond já escreveu. Ele fala: "Tarde de maio (o poema é um poema longo, mas ele é constrangedor, tal é a beleza dele. E o que ele tá falando, sobre uma coisa mais perecível, que é o sol se escondendo no ocaso, numa tarde luminosa de maio, aquela luz própria de maio. É isso. Ele fala sobre isso. Quer dizer ele fala sobre nada. Só eu, só o homem pode se incomodar e se comover com o sol se escondendo no horizonte, com uma árvore florida, com isso, com aquilo, com as coisas mais mínimas, mas rasteiras, mais cotidianas, que escondem, em si mesmas, a beleza. E é essa beleza que toda arte procura. Não importa o assunto. Não importa o tema. Não importa o enredo.É a beleza que se esconde nas coisas, que se revela. E é tão forte isso, que há pessoas que começam a olhar flores depois que viram flores num poema, que vão contemplar o céu estrelado, depois que viram o céu estrelado numa obra de arte. E fala: Como é que eu não tinha percebido que é bonito desse jeito? Então, foi a força, movedora e comovedora da arte, que faz com que nós abramos os olhos, para a maravilha da criação, a maravilha da experiência humana, que nos aguarda. Então quando perguntam: Qual é o papel da obra de arte? É nenhum. Ela não tem papel. Ela não é didática. Ela não é catequética. Ela não é filosófica. Ela é expressão pura. Você encontra um pintor, por exemplo, desenhando e apagando, desenhando e apagando, até se comprazer, não, agora está bom. Agora o quê? Um ramo, uma fruta, um perfil, um rosto, coisas que não valem absolutamente nada. É dessa matéria impoderável, sem valor quantitativo, é que é feita a obra de arte. Um quadro valer milhões é o mesmo que não valer nada, porque não tem como medir a importância, a magnitude daquilo que está expresso numa obra, que é a realidade espiritual. Então, os artistas, apesar de si mesmos, apesar das muitas bobagens que falam, às vezes, até sobre a própria obra, de tudo aquilo que ele discursa, de toda teoria, o que funciona aí é a obra. Ela está dizendo ou não. E por causa dessa qualidade eterna e essa imponderabilidade, eu vejo que, para a humanização, a arte está no mesmo caminho da mística, ou da fé religiosa, não da fé política, ou da fé filosófica, mas da fé religiosa e da mística, porque ambas experiências também são independentes da razão, são experiências, a beleza é uma experiência, ela não é um discurso. Se você, por exemplo, passa todo dia por um lugar e vê determinada obra, ou determinada casa, ou determinada coisa e um belo dia você se espanta com aquilo, você fala, Mas que beleza, eu nunca tinha enxergado isso desse jeito, pode dar graças, porque você está tendo uma experiência de natureza poética que é ao mesmo tempo, religiosa; religiosa porque liga você a um centro de significação e de sentido. Você fala: Ahh! Então tá. Dá pra eu viver mais. É indizível. Não tem palavras pra isso. É como a experiência mística. A pessoa chega perto de você e fala: Eu vi Nossa Senhora. Você discute com essa pessoa? De jeito nenhum. É indiscutível. É indiscutível. E é uma palavra - a palavra poética toda vida foi considerada a linguagem por excelência; se a gente pudesse falar tudo de forma poética, o descanso que seria, viu? Porque é a linguagem enxuta, concisa, ela não suporta enfeite, ela não suporta. Se você vai enfeitar um poema, já é um desastre absoluto. Guimarães Rosa falava assim: Não tenha medo de cortar quando você está escrevendo. As vezes tá até bonitinho. Mas corte sem dó!Porque não precisa mais daquilo, você já disse. E quanto mais eu invento, enfeito querendo dizer, mais eu estrago, ao fim não sobre nada, sobra retórica. E o que que é a retórica? É quando a expressão do sentimento é maior do que ele. É isso que é retórica. É insuportável. Eu falo tanto que amo você, que a gente começa a duvidar, não é? A retórica é insuportável, agora os políticos adoram. Mas nós não acreditamos mais, graças a Deus. Nós somos escaldados. Nós queremos agora um discurso político que seja poético, quase impossível.

Esses braços da experiência humana, que são arte, mística e fé, que são, para mim, são braços do mesmo rio. É a terceira margem de Guimarães Rosa. A terceira margem da alma. Então, olha que maravilha, se as escolas compreendessem isso, em vez de discutir poesia, oferecessem a própria poesia, oferecessem a literatura, a arte, o teatro, tudo aquilo que na escola é humanizador. Mas o ensino hoje está voltado para a parte lógica, para o intelectual - intelectual no sentido pior dessa palavra. Aquilo que não toca o sentimento: "Eu sou um intelectual, eu não me comovo"; o intelectual é dono de si - essa ideia é equivocada, assim como é equivocada também a ideia do poeta. Se vocês querem dar uma função importante para alguém, não dê para o poeta, porque ele está com a cabeça nas nuvens. É exatamente o contrário. Quem tem a cabeça nas nuvens não é caso de poesia, é caso psicologia. Não é mais literatura, é outro setor. Então, o verdadeiro artista é ele quem está exatamente centrado na realidade. A arte não aliena ninguém. Não aliena ninguém. Ela não tira da realidade. É o contrário. Ela traz para o real, para a realidade, toca na minha intimidade, aquilo que eu sou quando estou sozinho comigo mesmo. E quando isso acontece, é uma festa. É o reino do céu, no qual só tem acesso as crianças, os que se tornam crianças.

A poesia, sendo expressão pura e ela não sendo discurso lógico, ela me dá o peixe sem que eu precise de entender o anzol. Eu fiz uma vez uma experiência muito interessante numa fazenda, onde estavam pessoas, assim, simples, sem escolaridade, sem esse poder de articulação que vocês tem, e nós, às vezes temos - pensamos que temos - a pessoa escutou e falou assim: Mas superior esse negócio aí! Superior esse negócio aí! Quer dizer, ela entendeu? Entendeu sim! Entendeu sim. Ela pode não decodificar os versos, mas ela saca a pulsação vital da obra, da poesia. Ela fala: É bonito. Fala de novo! Fala aquele negócio pra nós de novo. Eu conheci um operário, ferroviário, ele tava fazendo, arrumando a casa dele, então ele fez um jardim, eu falei: Ah que bom! Você está fazendo uma reforma bacana aí. Ele falou: Tô! E eu vou fazer um jardim aqui, mas não é desse quadrado sem poesia não, vou fazer, umas coisas assim, que tem umas voltas. Ele é uma pessoa barroca, não é? Sem saber o que é barroco. Bem barroco. Disse: Eu vou fazer umas voltas e ali na platibanda da casa eu vou fazer uns fingimentos. Olhe o homem, a alma desse operário, desse ferroviário, que vivia com a camisa cheia de graxa, eu o conheci pessoalmente, é o poeta. Eu fazer jardim, sem, essas coisas sem poesia? Todo mundo, fala poesia, palavra, não é? Mas ele entendeu poesia aquilo que, esses fingimentos aí que tá um tombo na casa, ela fica bacana, bonita. É a beleza. É a necessidade da beleza. É a mulher na favela que mora no barracão de lata e pega o plástico, estica o plástico, põe uma jarra e uma rosa de plástico, em cima e fala: Bom, agora essa casa ficou boa. É isso, gente. É isso. Essa fome de beleza ela é universal. Nós não podemos achar que alguém não entenda isso, todo mundo entende, porque nós somos feitos da mesma farinha. Então, essa fome é universal. É o pedreiro assistindo balé pela primeira vez e cutucando o outro, "Isso se chama balé, viu", explicando o outro que tava mais ignorante que ele e ele maravilhado. O que que ele tava tendo? Quanto que vale um balé? Vale nada! Era na praça pública. Era de graça. Mas deu a ele dignidade. Eu sou pedreiro, mas eu entendo de balé. Eu vejo balé. Todo mundo entende de tudo. É a coisa mais democrática que tem. E por que que é tão... elitizamos tanto isso, não é? Há pessoas que tem vergonha de entrar na livraria, não é porque não queiram, é vergonha: eu não mereço entrar numa livraria. Isso eu acho que é culpa do nosso sistema de educação, que não coloca o ensino da língua via literatura brasileira; essa língua maravilhosa que é a língua portuguesa. A gente vê hoje até nas construções - a construção civil - quando você está precisando de apartamento, você vai procurar um apartamento pra morar, é tão impressionante a feiúra do desenho, não tem luz, é apertado, é cheio de coisinha, como disse uma amiga, ela falou assim: Eu não aguento mais azulejo com barrado, eu não aguento, eu não aguento, porque tudo isso tem uma coisinha que seria um sinal de algum bom gosto, de alguma humanização, mas você não aguenta morar ali dentro. São as escolas, as igrejas muito feias, são verdadeiros armazéns transformados em igrejas, quer dizer, que nós precisamos da beleza. Beleza não é luxo, é necessidade.

Eu vou só contar, não é anedota não, é bíblico, mas parece anedota, quando Judas... quando Jesus estava comendo na casa do fariseu, e, Madalena veio e derramou bálsamos caríssimos nos pés de Cristo. Judas falou, Que desperdício! Onde já se viu fazer uma coisa dessa? Dinheiro que podia dá comida aos pobres... Cara legal, não é? A gente faz muito isso, não faz? Que bobagem! Devia dar esse dinheiro pros pobres, faz essa peça. Mas isso é de uma hipocrisia profunda. Aí Cristo falou com ele, Olha, pobre vocês sempre terão convosco, mas ela tá me ungindo pra sepultura, ela tá derramando o que há de mais precioso, que é tô precisando agora. E nós precisamos disso, não é verdade? Livros feios para dar para o povo, com a ilustração feia! Eu procuro, quem souber onde tem, me conte, uma bíblia para criança que seja bonita, bela; as ilustrações são horrorosas. Não é verdade? Não, isso é porque é um texto engajado, o povo é pobre, o menino não pode ter coisa bonita! Mas é o pobre que tá precisando mais ainda, ele não tem, e já vai ter o livro mais feio, a ilustração mais feia. Então, em todo um sentido de economia muito equivocado. A arte não é econômica, não. Ela é generosa. É econômica só na hora de fazer, que você não pode por enfeite, não é? Ela não suporta. Ela já é bonita demais.


* Transcrição da entrevista-palestra da poeta Adélia Prado ao programa Sempre um papo. A transcrição foi feita por Pedro Fernandes de O. Neto.

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