Saramago: Biografia, de João Marques Lopes

Por Pedro Fernandes

É com esse título que, um mês antes do previsto, chega às livrarias brasileiras a primeira biografia do Prêmio Nobel José Saramago - Saramago: Biografia. O nome por trás do feito é um nome de responsabilidade. Também, para uma personalidade do porte de Saramago, há que ser um nome de responsabilidade: João Marques Lopes, o autor de outras grandes biografias, como a de Eça de Queirós e a de Fernando Pessoa.

Para quem é conhecedor de algumas linhas bussolares da pessoa que é o escritor português, ficará, ao terminar a leitura deste texto de João Marques, com um gosto de "quero mais" ou "poderia ser melhor". Para os que desconhecem Saramago, não sei precisar. Mas, tenho quase certeza de que não ficarão também saciados com essa incursão biográfica. São notas breves ou estaria nelas o que certa vez disse o próprio escritor, que na sua vida não há nada de muito interessante que sirva aos biógrafos?

Mas, enfim, ressalto que o livro de João Marques não me trouxe tantas novidades acerca do escritor. Principalmente depois de ter lido títulos como As pequenas memórias ou os cinco volumes dos Cadernos de Lanzarote.

Aquilo que se apresentou com novidade aos meus olhos não passa de dois elementos. Um,  a significativa atuação política de Saramago - fato que se o leitor de Manual de pintura e caligrafia (já assinalado pela crítica como o mais biográfico dos romances saramaguianos) atentar bem, não será tanta novidade assim. A meus olhos, entretanto, mesmo já tendo lido o Manual (só que totalmente desprovido desse teor autobiográfico) foi o primeiro ponto significativo em Saramago: Biografia - conhecer sobre o escritor atuante (sempre) muito antes de vir a ser a personalidade reconhecida que é hoje. 

Outro elemento, este, esclarecedor, terá sido a descoberta da leva de materiais escritos no correr dos anos ditos de silêncio - entre a publicação do insucesso Terra do pecado, em 1947, e Os poemas possíveis, em 1966. João Marques traz a tona, além do recusado romance Claraboia, outros textos, tanto na prosa (romances, contos, crônicas, peças de teatro) quanto na poesia - que até hoje permanecem intocáveis, denotando que os anos de silêncio, foram, a bem verdade, anos de maturação do escritor e da sua escrita.

Pode pecar pela obviedade - aos que já conhecem de longa data Saramago - mas, justiça deva ser feita ao trabalho desenvolvido pelo biógrafo. A vida de um escritor, a meu entender, deve ser lida por através de seus escritos. Há entre o escritor e seus escritos uma relação simbiótica (diria) que muito dele escapa para a letra. E é esse o procedimento adotado por João Marques Lopes. São os textos mais simples de Saramago - como os editoriais para o Diário de Lisboa - aos mais densos e complexos - como seus romances - o suporte para que seja posta no papel a vida do escritor. Trata-se de um registro biográfico sem a preocupação meramente cronobiológica dos fatos, mas uma preocupação de composição-mosaico daquilo que poderíamos chamar de retrato do escritor português.

Ligações a esta post:
Leia um capítulo da biografia de João Marques Lopes, aqui.



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