Há perigo em toda lista
Por Pedro Fernandes
É verdade que as escolhas, qualquer uma, não deve, em tempo algum, agradar a Deus e ao Diabo. Quando se elaboram listagens sempre corre-se o risco, entretanto, de cometer pecados ainda mais graves e não agradar, simultaneamente, nem a um nem a outro. Já comentei certa vez por aqui da moda que é hoje as listas. Invenção norte-americana, ao que me parece, e ganhou status de qualificações. Num universo saturado de tanta coisa as listagens (algumas e poucas!) agradam e são (por que não?) úteis.
Recentemente a Universidade de Coimbra aderiu ao modelito e pôs à escolha aquilo que seriam os dez romances mais representativos da língua portuguesa. E como nas muitas das listagens que rola por aí deu vexame. Primeiro, me chama atenção o número curtíssimo de dez romances - quando sabemos que a lista é bem (mais bem mesmo!) maior do que isso. Não deu em outra. Pecou-se. E pecou-se feio.
Com uma sugestiva alcunha de 10 Paixões em Forma de Romance, o júri do concurso selecionou Os Maias, de Eça de Queirós, Memorial do Convento, de José Saramago, Dom Casmurro, de Machado Assis, Terra Sonâmbula, de Mia Couto, Amor de Perdição, de Camilo Castelo-Branco, Aparição, de Vergílio Ferreira, O Delfim, de José Cardoso Pires, Esteiros, de Soeiro Pereira Gomes, A Sibila, de Agustina Bessa-Luís, e Sinais de Fogo, de Jorge de Sena. Segundo o diretor da Imprensa da Universidade, João Gouveia Monteiro, para chegar a esta lista final “o júri teve em conta a diversidade e representatividade de diferentes épocas, correntes, geografia e gêneros, bem como a expressão da vontade dos votantes”.
Bem, me parece que, o que prevaleceu, esteve longe da técnica. Se esperava que, além dos critérios elencados, fossem tomados outros em conta, mais decisivos até que aqueles, tais como o caráter de sofisticação da construção narrativa, seja pelo enredo, seja pela linguagem, seja pela série de temas caros ao entendimento da sociedade e do homem, ou ainda as razões estéticas que deram luz a esses romances. A lista, entretanto, deixou mais à amostra aquele critério das vontades do júri e a recuperação de figuras expoentes (no sentido não apenas de feitio da arte narrativa, mas de conhecimento) de nomes externos ao território português, haja vista os nomes de Machado de Assis, um brasileiro, e Mia Couto, um moçambicano.
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