Dia Mundial do Livro

Por Pedro Fernandes

Nota: as ideias aqui apresentadas são notas de um texto em elaboração, e se os jornais colaborarem, poderá aparecer sob forma acabada de texto.






1. Pela data quero retomar aqui algumas discussões que venho travando noutros espaços acerca de uma questão um tanto quanto delicada para o estágio atual do livro: uma "massificação" (o termo é esse porque não achei outro que o valha) da obra literária. E isso começou numa comunidade no Orkut dedicada ao escritor português José Saramago em que um orkuteiro entrou para postar um link para baixar livros online e eu me manifestei contrário à ideia: "Baixar um livro que não encontramos de modo algum por aqui pode ser, mas as obras do Saramago, todas, acho um desrespeito para com o escritor... Se ainda fosse um "crepúsculo", um "lua nova", "lua cheia", "lua minguante", "lua quarto-crescente", tudo bem, é comercial, não vale nada mesmo..." Ironizei. Ao que me responderam discordar de minha posição. Bem, já é sabido que minha postura nessas comunidades (aliás a única que dou pitaco é essa do Saramago, nas outras sou figura morta) costumo mesmo soltar rojão - provocações, para usar um termo mais leve. 

2. E como tudo que a gente escreve por ser lido com as piores ou melhores intenções (mas sempre as piores, diga-se), disseram-me que os "crepúsculos" da vida é também fruto de um trabalho. Ao que respondi: "é sim fruto de um trabalho; não estou negando isso; só não considero labor artístico, mas labor capital, entende? é a essência meramente comercial de tais obras que está em jogo. não que eu considere uma queima de tais livros - julgo mesmo como importantes à formação leitora dos sujeitos, mas quando os crucifico, como agora, estou num terreno meramente pessoal. pode-se dizer que sou um sujeito que cospe no prato que um dia comeu; digo isso porque comecei sendo leitor lendo esses romances baratos cujo modelo já está pronto e carece apenas de o escritor fazer os encaixes necessários para parecer diferente daquilo que ele escreveu/publicou semana passada."

3. E aí a questão se tornou um verdadeiro rolo. Se antes eu havia chamado a atenção para a relação arte-capital, agora a questão acaba tomando outros rumos (de certo modo rumos implícitos na questão primeira), como o de valia da arte ou democratização dela ou ainda para uma questão bem maior, "o que é arte?". Foi o que dois dos orkuteiros da comunidade veio dizer: um, que o papel da internet está em justamente democratizar o acesso a arte e outro disse que para uns Crepúsculo  é arte, para outros Saramago é chato, que é tudo questão de gosto e gosto não se discute. 

4. Mas, sem me estender tanto no caso, o que eu quero reiterar com isso, nesse meio virtual em que me situo é somente um fato: a nossa relação com os livros está mudando. E mudando numa escala sobre qual não conseguimos acompanhar. De modo que, é essa mobilidade a que estamos sujeitos e mais ainda os artefatos que nos eram antes escudos e agora são substituídos por uma película simples carecem de uma discussão mais acurada sobre. Não sabemos qual rumo tomamos com essas novas tecnologias. Que a internet deve ser um espaço para a democratização da arte conforme defendeu aquele orkuteiro, não tenho dúvidas, mas há que se discutir o conceito de democratização nisso tudo.

5. E quero chegar a conclusão daquilo que acredito: acredito que a difusão do livro, por exemplo, há de ser por outros meios que não necessariamente esse de piratear o produto e entregá-lo à própria sorte da web; essa difusão online é mero castracismo; lógico que, como toda regra há exceção, a não ser que esse seja o intuito do autor, como os que se lançam nos e-books da vida.

6. Vejo processo de democratização do livro (se nos atermos em específico à questão) não deve ser rebaixado a ideia de banalização, que é o acontece quando o livro de papel ganha as malhas das redes de download. É algo portanto bem mais complexo que simplesmente jogar livros na rede. Primeiro há que se vê o que podemos fazer nós pelo livro; temos os nossos, lemos, mas não temos nunca a cultura de indicar as nossas leituras a esses menos favorecidos, tampouco de emprestar o livro. Ainda somos egoístas a ponto de achar que o livro é propriedade fechada ao seu "dono".

7. Segundo, o que podemos nós leitores fazer para exigir do Estado (e o Estado diretamente dos grandes conglomerados editoriais) políticas de incentivo à leitura? Sobretudo: os usuários da internet "carentes" para compra de livros, terão mesmo na cultura do download a das leituras desses downloads? (Não sei se há pesquisas do gênero - se não fica a dica).

8. Aqui entramos noutra rede de questões que dizem respeito ao uso da internet: tais pessoas estão preparadas para essa cultura do download ou se reduzem às doses de besteirol na rede? Sobre isso, há dados: o Brasil é o pior país no mundo em termos de uso eficiente da internet.


Comentários

Compartilho de teus questionamentos, Pedro. Há muito mesmo o que fazer para que o livro passe a ser, de fato, um objeto transformador e de transformação em nossa sociedade. Que haja pão, gás, escola, moradia e bons livros à mesa.

Abraço forte.
Continuemos...

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