O itinerário pelas cinzas da memória

Por Pedro Fernandes




Não faz muito tempo que eu redigi um texto para o caderno Domingo, do jornal De Fato, por onde sempre tenho publicado material, que tratava, o referido texto, do descaso com a memória no Brasil, mais ainda no Rio Grande do Norte; o texto reflete sobre dois lugares que eu visitei há algum tempo: o Museu Municipal, antiga cadeia pública, em Mossoró e o Instituto Geográfico, em Natal. O fato é que nas avalanches tecnológicas - que de vez em quando nos deixa na mão, perdi este texto e por ter ido tardiamente ao jornal também não consegui, misteriosamente, localizá-lo. Acontece; e quando algumas contribuições para a imprensa são enviadas para veículos diversos e às vezes pela morosidade com que os textos são editados nem sempre o autor consegue acompanhá-las. E, pronto, perdem-se; cai no extenso buraco negro da inexistência.

Antes de ir ao jornal, cavoucando na web através do Google, fui parar não num arquivo que desse com o meu texto perdido mas com os arquivos do jornal Tribuna do norte; eis que encontro um texto do repórter Yuno Silva, publicado em 20 de maio de 2009, portanto, muito anterior ao meu, mas que em muito se assemelha à temática que me propus tratar: no caso dele, estamos diante de uma reportagem e o meu era um texto de opinião.

Em "Um dia de turista nos museus de Natal", Yuno Silva retrata um passeio realizado pelos principais museus da capital do Rio Grande do Norte. Diz ele "respirou mofo, desviou de morcegos e constatou que o quadro não passa de um esboço borrado pendurado em uma parede suja e esburacada. Em muitos momentos, o aspecto era tão assombroso que mais parecia um cenário trash de filme B, daqueles onde atores do terceiro escalão se esforçam para suprir a falta de recursos técnicos."

Além do caráter de denúncia martelado no texto, o jornalista traça um perfil do que se necessita ser feito para amenizar a situação ou pelo menos dar uma mão de cal no sujo do cenário: "Está na hora de se criar mecanismos para envolver outros setores da UFRN, como o Departamento de Artes na consultoria e criação de ambientações condizentes. Falta clima de museu no MCC, onde a maior emoção vivenciada pelo visitante é a revoada de morcegos que moram nas réplicas de cavernas. A entrada custou R$2 com direito a material impresso explicativo. Não há guias e a mochila ficou guardada em um armário na recepção."

Em reportagem publicada em 18 de fevereiro de 2010, também na Tribuna do norte, novamente o cenário constatado pelo repórter há cerca de um ano é reencontrado tal e qual como estava. Tais textos são importantes porque vêm reforçar da necessidade que temos de erguer um patrimônio histórico cultural de qualidade para o Rio Grande do Norte; está em jogo a própria preservação da memória e da identidade potiguar que, por enquanto, figura apenas com um extenso breu de cinzas, entregue à desordem do tempo e ao desinteresse dos políticos e da comunidade.


Ligações a esta post:
Para ler a matéria de Yuno Silva, clica aqui;
Para ler a matéria recentemente publicada por Maria Betânia Monteiro, clica aqui;
Para ler comentário meu acerca do descaso para com o Museu Câmara Cascudo, clica aqui.


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