Era uma vez em Tóquio, de Yasujiro Ozu




Na invasão da cultura oriental pela ocidental, sai ganhando a câmera fixa e contemplativa deste filme familiar


Yasujiro Ozu é considerado um dos maiores nomes da história do cinema japonês. Começou a carreira de mais de 50 filmes em 1929, rodando comédias muito semelhantes às feitas em Hollywood naquele momento, A segunda fase de sua obra é a que mais tem destaque, quando, no pós-Segunda Guerra Mundial, o cineasta radicaliza sua estética e afunila o tema que será, a partir de então, tratado em sua obra. Grosso modo, as histórias partem do cotidiano de famílias japonesas para falar de assuntos como juventude e velhice, vida e morte e, sobretudo, a tensão entre tradição e modernidade (a pauta do Japão invadido pela cultura ocidental dos vencedores da guerra, no caso, os Estados Unidos). Esses assuntos serão mostrados com a câmera rigorosamente fixa e baixa, e os diálogos filmados com os atores de frente para a câmera, alterando-se entre um e outro com cortes secos.

Uma gramática da imagem, que está impecável em Era uma Vez em Tóquio, é um dos pontos altos dessa segunda fase. Nesse filme, um casal de idosos sai de uma pequena cidade para passar alguns dias com seus filhos, em Tóquio. Lá são recebidos com simpatia, mas sem muita atenção. Os filhos, envolvidos com seus afazeres cotidianos, têm pouco tempo para acompanhá-los. A viagem funciona para eles como um último reencontro.

Se o lugar-comum (inclusive no Japão) dizia Akira Kurosawa era "ocidentalizado" com seus filmes espetaculares e ágeis, o minimalismo e o tom contemplativo do cinema de Ozu fazem dele "o mais japonês dos cineastas japoneses", segundo as convenções. O fato é que um cineasta ocidental por excelência, como Stven Spielberg, pegou emprestado um recurso de Ozu para rodar o seu clássico ET - O Extraterrestre (1982). O longa é filmado com câmera baixa, para outros propósitos: traduzir na tela o ponto de vista da criança. Uma indireta homenagem ao cineasta que até mesmo no Japão era considerado extremamente conservador, num momento em que, além de Kurosawa, havia outro mais dinâmico, Kenju Mizoguchi. E, anos antes de sua morte, em 1962, diretores como Seijun Suzuki e Shohei Imamura arriscavam-se naquilo que seria a Nouvelle Vague japonesa. O maior legado de Ozu é tratar, de maneira inédita, a ocidentalização do Japão com um vigor raras vezes visto na história do cinema.

* Revista Bravo!, 2007, p. 40


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