Diário pedagógico: a apresentação
Por Pedro Fernandes
No dia 25 de março de 2009, o jornal Correio da Tarde publicou na segunda página, na sessão artigos, um texto meu intitulado "Um genocídio outro, um genocídio só"¹. Esta inserção de opinião expunha as condições que professores da rede pública de ensino enfrentam diariamente ao mesmo tempo em que apresentava uma crítica aos destinos traçados pelas forças maiores, o país, estados e municípios, têm feito: como o uso da força a fim de barrar os movimentos de professores que ano após ano tem lutado em prol de melhores condições salariais e de trabalho.
No texto para o Correio da Tarde também indiretamente desconstruí ou reconstruí uma imagem que havia feito do professor noutro artigo publicado em 15 de outubro de 2008 no mesmo jornal e replicado na Tribuna do Norte. Em "Escritores da liberdade", havia dito que o professor é uma espécie de super-herói, uma imagem da qual me apossei e reapropriei para o nome de deus; isto é, antes de ser um herói, o professor há que ser uma espécie deus para enfrentar todas as más condições de trabalho que lhe são impostas.
Essa minha visão acerca da educação pública sempre foi aguçada desde quando pude notar ainda nos meus anos de Ensino Médio como estudante, e não faz tanto tempo, que essa instituição – bem maior da humanidade – no Brasil andava mal das pernas. Não é necessário ser especialista ou renomado em assuntos educacionais para constatar isso. Basta, como disse noutra ocasião, que passemos um expediente numa escola pública qualquer para percebermos as mazelas que não só rondam, mas já se instalaram e fizeram da escola pública morada fixa. Generalizo porque são poucas as que ainda reúnem condições de excelência.
Entretanto, essa visão foi se alterando desde quando assumi, temporariamente, a vaga de professor de Língua Inglesa numa determinada escola da rede municipal do interior do estado do Rio Grande do Norte. Note bem: minha formação é em Língua Portuguesa. A escola, como muitas outras, carecia de professor de língua estrangeira. A falta de mão-de-obra junto com a minha necessidade de trabalho culmina com um usuário básico de inglês tentando ser professor. Uma situação que se repetiu quando fui estudante. No meu Ensino Médio faltavam professores de Química, Física, Biologia... Possuíamos estagiários temporários que condensavam todo o conteúdo do ano em poucos meses de aulas. Nada mudou.
Muitas das impressões de "Um genocídio outro, um genocídio só" foram recolhidas durante essa minha estadia no interior do Rio Grande do Norte. Em conversas informais com amigos tenho relatado algumas das questões que pude perceber nos poucos dias que tive lecionando nessa escola. Em tais conversas tenho dito que não sou nenhum possuidor de espírito de Madre Teresa de Calcutá para encontrar, dar e resolver o rosário de problemas instalados apenas na educação pública desse município ao qual me vinquei por alguns dias. Tenho mesmo a certeza de que a própria Madre se desse para os assuntos da educação também concordaria comigo.
É nessas horas, que dentro de mim - no alto de meu senso pedagógico erguido nos quatro anos de licenciatura - que se gesta um desengano mesclado com a vontade de rasgar aos quatro cantos do mundo as mazelas vistas e vivenciadas nessa estadia. Isso tudo me explode na escrita. Ela é a minha ação de Madre Teresa diante da situação, apesar de não ser possuidor de tal espírito, conforme já disse. Envolvo-me com essas questões porque me vejo na obrigação, afinal, para isso fui educado; é esta a minha profissão.
E desse impulso de revolta nasce essa série de textos aqui publicados sempre às quartas-feiras na sessão "Minhas falas". Ainda não tenho estimado o número exato de postagens, mas posso desde já incluir os dois textos que citei no início - "Um genocídio outro, um genocídio só" e "Escritores da liberdade" - como introdutórios das questões desenvolvidas adiante. "Diário Pedagógico" é o título que dou a este feixe de textos, justamente porque foram escritos tomando como foco o dia-a-dia do ambiente escola e tem como objetivo explorar e expor as questões da educação na escola e no município onde estive.
Nota:
1 Este texto aparece reproduzido no blog com outro título e revisto: "O estado da máquina de manter os índices péssimos da educação pública". Está disponível na lista de links oferecida abaixo.
Ligações a esta post:
>>> Leia "O estado da máquina de manter os índices péssimos da educação pública"
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