Com licença poética, a poeta (e a poesia de) Adélia Prado
Com licença poética Quando nasci um anjo esbelto, desses que tocam trombeta, anunciou: vai carregar bandeira. Cargo muito pesado pra mulher, esta espécie ainda envergonhada. Aceito os subterfúgios que me cabem, sem precisar mentir. Não sou feia que não possa casar, acho o Rio de Janeiro uma beleza e ora sim, ora não, creio em parto sem dor. Mas o que sinto escrevo. Cumpro a sina. Inauguro linhagens, fundo reinos — dor não é amargura. Minha tristeza não tem pedigree, já a minha vontade de alegria, sua raiz vai ao meu mil avô. Vai ser coxo na vida é maldição pra homem. Mulher é desdobrável. Eu sou. “ Uma das mais remotas experiências poéticas que me ocorre é a de uma composição escolar no 3º ano primário, que eu terminava assim: Olhai os lírios do campo. Nem Salomão, com toda sua glória, se vestiu como um deles... A professora tinha lido este evangelho na hora do catecismo e fiquei atingida na minha alma pela sua beleza. Na primeira oportunidade aproveitei a se