A vida e a poesia de Manoel de Barros
Falar sobre
Manoel de Barros é falar da palavra enquanto instância infinita de sentidos.
Sua poesia se constrói num denso território semântico mas preenchido de nadas.
É o poeta da simplicidade, dos simples, de quem vê o cotidiano com olhos aguçados
de poesia.
Nascido em
Cuiabá, Mato Grosso, em dezembro de 1916, o ofício de poeta confunde-se com o
de advogado nunca exercido e o de fazendeiro, tarefa para a qual mais
adequou-se pela possibilidade de melhor aproximar-se da construção de um
território fértil para sua obra.
Pode-se
dizer que o poeta é filho da terra. Tinha somente um ano de idade quando o pai
decidiu montar a fazenda no Pantanal mato-grossense e, cresceu brincando no
terreiro da frente de casa, pés descalços, entre os currais e as coisas
simples, elementos juntados, mais tarde, na composição de tons com que pinta os
versos.
Aos oito
anos de idade foi para o colégio interno de Campo Grande e depois para o Rio de
Janeiro. O próprio poeta diz que não gostava de estudar até ter o seu primeiro
encontro com o que considera gênio da escrita, o padre António Vieira.
Na sua
formação, Manoel de Barros não seguiu os sonhos do pai que era o de voltar a
terra pantaneira e trabalhar em um cartório. Viajou para a Bolívia e para o
Peru onde passou um certo tempo. Depois foi para Nova York, onde fez curso de
cinema e pintura no Museu de Arte Moderna.
Desde então,
passou a compreender a arte moderna como aquela desprovida de tudo e dotada da
liberdade, sendo ela um resgate da diferença; encantou-se com o sonho surrealista
e não tardará insuflá-lo na possibilidade de um poema moderno com laivos dessa
vanguarda. É justamente nessa época em que produz os primeiros versos, ainda
que tenha escrito seu primeiro poema aos 19 anos.
Sua volta ao
Brasil lhe trará um casamento, depois de namorar somente três meses com a
mineira Stella. Depois desse casamento, realizaria, em parte os desejos do pai:
é quando assume-se fazendeiro e vai cuidar das terras no Pantanal.
É quando sai
seu primeiro livro, Poemas concebidos sem pecado. Este foi feito
artesanalmente por vinte amigos numa tiragem de 20 exemplares e mais um, que
ficou com ele. Ainda nos anos 1980 Manoel recebe crítica de peso; ninguém menos
do que Millôr Fernandes, colunista nas revistas Veja e Isto
é além do Jornal do Brasil começou a falar para o público da sua
poesia. Depois caiu na boca de outros críticos e a obra ganhou cada vez mais
lugar na literatura brasileira contemporânea.
Para Geraldo Carneiro, a obra do poeta sul-mato-grossense assimila muito do
projeto literário de Guimarães Rosa, pela capacidade de introduzir pequenas
cisões ou ampliações de sentido no curso da semântica e da sintaxe da língua,
claro, sempre tendo por base o vocabulário coloquial do interior, com o qual
sempre produz novas significações para o poema.
De certo modo, ao aproximar-se
do autor de Grande sertão: veredas, o poeta está em diálogo com o que foi
proposto desde Oswald de Andrade no seu Manifesto Antropófago: apropriar-se da
linguagem do outro e fazê-la novidade para o espaço literário.
Publica
depois títulos como Compêndio para uso dos pássaros, Gramática
expositiva do chão, Tratado geral das grandezas do ínfimo. Para o
crítico Antonio Houaiss, a poesia de Manoel de Barros, apesar de tomada por
laivos surrealistas, é construída com bastante racionalidade: as imagens aí
evocadas são, num primeiro instante, visões oníricas, mas logo se apresentam
muito próximas à realidade.
Sempre
publicando livros muito breves e singelos, toda sua poesia foi reunida pela
primeira vez numa antologia em 2010; depois aparecem mais alguns inéditos. E
muito ainda terá ficado entre os papéis do poeta depois de sua morte em
novembro de 2014.
Ligações a esta post:
* Este texto passou uma revisão em novembro de 2014. Parte das informações apresentadas foram pesquisadas a partir do texto publicado no site Releituras.
Comentários