Experimentar a dor
Por Gabriel Stroka Ceballos
Marguerite Duras. Foto: Robert Doisneau |
Hoje em dia
espera-se pouco. E por pouco esperar qualquer espera parece insuportável. A
mensagem não respondida por cinco minutos parece levar uma eternidade. Além da
crescente velocidade nas comunicações, a cada dia que passa arranja-se uma
distração tecnológica a mais. Assim, talvez, cada vez sabemos menos sobre o que
é experimentar a angústia tão humana.
Recentemente
li A dor. Confesso que fui levado a ler Marguerite Duras pela convergência de
dois fatores quase que superficiais à sua escrita. Os primeiros foram o
título e a capa desta edição que peguei em algum sebo pela vida e tinha aqui
perdido em minha pilha dos “para ler” e o segundo tem a ver com a onda
feminista, que me abriu os olhos para a verdade incômoda de que eu raramente escolhia escritoras como próxima leitura.
E o que se
pode dizer de Marguerite? Muito, definitivamente. O primeiro texto do livro é o
que dá título à edição. “A dor”. A autora não faz rodeios, não floreia nada. E
ainda assim, não cansa o leitor ao extenuar seu estado físico e de espírito ao narrar sobre a espera de notícias de seu marido na guerra. Com frases curtas e diretas, às vezes
de uma só palavra, a melancolia ultrapassa as folhas. É impossível não
senti-la. Pois a dor não está apenas nos fatos. Está nos minutos, nos dias, nas
semanas, nos meses de espera. Um aguardar com a esperança perene de que no
próximo dia tudo se resolva. Seja para bem ou para mal. Uma espera tão
angustiante que torna a narradora algo com um ser embriagado. Um ser perdido em
alguns dos sentidos mais crus da existência. Um ser sempre sentindo, às vezes
fazendo, raramente questionando.
Aí talvez esteja a diferença entre os escritos
que tendem à filosofia e os que tendem à literatura (Ainda que este texto não
se trate de ficção e sim de entradas de um diário antigo da autora). Um
filósofo age como um cientista: observa a vida de fora (ainda que não possa
sair de fato dela), observa a dor, o amor, a felicidade, como se pudesse
fazê-lo objetivamente. A literatura pode muitas vezes até questionar o que quer
que seja, mas tende principalmente a estressar o sentimento, como se faz com um
trapo, vivendo-o, entregando-se a ele. É quase como comparar uma aula de
neurologia com uma sessão de terapia, na primeira está a descrição de uma parte
da vida, na segunda está uma parte da vida.
Poder-se-ia
até falar sobre o restante do livro. Textos como “Ter, o miliciano”, também são
deliciosos. Mas, depois de ler “A Dor”, tudo é ofuscado. Leem-se as próximas
cento e poucas folhas como se estivéssemos de ressaca. Os outros textos são paliativos
para o rasgo causado por um texto que mereceria uma edição só para si.
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