Um conto de Virginia Woolf
Por Pedro Fernandes
Não faz tanto tempo que ouvi falar sobre a literatura de Virginia Woolf. A primeira vez, acredito, foi num dos muitos congressos que tenho frequentado nos últimos quatro anos: lembro-me de uma comunicação sobre o conto "A marca na parede", conto que tive a oportunidade de ler muito recentemente e até o presente, na minha inocente visão, um dos melhores da coletânea Contos completos (Cosac Naify), edição que tenho me dedicado à leitura nesta última semana.
Indo ao site da editora que publicou em 2005, no Brasil, uma edição dos Contos completos constato alguns dados biográficos da escritora inglesa. Virginia Woolf nasceu em 1882; foi leitora desde cedo, quando numa rara atitude permitida à mulheres de seu tempo, teve acesso à biblioteca do pai, Leslie Stephen, que era editor e esse ato permissivo fez com que desse à filha uma educação diferenciada ao que se era costume ser dada às mulheres. O contato com os livros é certamente o melhor caminho pelo qual pode trilhar qualquer escritor e não foi diferente à Virginia: os livros parecem ter fundido um grande conhecimento da tradição a uma adoção visceral das práticas e da poética do movimento renovador. É conhecida pela capacidade de renovação da narrativa literária a partir dos anos 1920.
A escritora foi dona de uma vida conturbada e de muitas perdas. Primeiro, a morte da mãe, em 1895; em seguida pela morte do pai, em 1905. Mais tarde, o irmão Thoby, com quem fora à Grécia e de onde deriva o conto "Um diálogo no monte Pentélico". A crítica em torno de sua literatura marca a partir de 1912, quando já casada com Leonard Woolf, se dá o início da fase áurea de sua produção literária. Coincidentemente, é também por essa data que se ampliam as crises mentais que terminariam por levá-la ao suicídio, em 1941. Além da obra-prima e grande fôlego escrita por Virginia vale ressaltar ainda a criação por ela e o marido da célebre editora Hogarth Press, que editou sua obra e nomes como T. S. Eliot, poeta de quem Virginia era muito amiga.
Depois de ler "A marca na parede", busquei alguns ensaios sobre a obra e o que mais encontrei foi que o conto de 1917 (foi este o ano em que o texto foi escrito) marca um momento decisivo na carreira de Virginia, porque é a partir dele que a escritora experimenta afastar-se da perspectiva realista pelo emprego do monólogo interior ou, do que será conhecido mais tarde, por fluxo de consciência. Esse estilo facilitaria o uso da exposição sobre o da narração e permite ao narrador apresentar na forma estrutural do texto a experiência caótica e a impossibilidade de apreensão da exterioridade em sua plenitude pelo pensamento.
E o conto é repleto desse ir e vir da memória num fluxo contínuo, o que só permite ao leitor um acompanhamento sobre as simbologias que representam tais impressões. Rompe-se, em definitivo, com a ideia de verdade, por exemplo. A marca na parede vista numa tarde de janeiro, no inverno, é uma espécie de gatilho, recorrente no texto e ponto de partida para que o narrador construa suas reflexões sobre o que viu. Essa visão vem intercalada por uma quantidade diversa de evocações imaginárias - e é aqui que se permite a introdução de revisão sobre o que é verdade e mais: sobre essência das coisas, sobre as incertezas da vida, as fragilidades do ser humano, a morte, a relação entre o eu e o outro. Trata-se de um texto que desdobrado: uma coisa leva a outra. É um texto rico em imagens, marcado pelo presente do narrador e o seu passado.
Abaixo, você pode ler o conto.
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